Em
primeiro lugar, se você é aquele sujeito que acha que se
professores e funcionários estivessem armados dentro da escola o
número de vítimas seria menor, faça um favor a nós dois e encerre
sua leitura por aqui. O que eu penso não é para você.
Cada
novo caso registrado de mortes por atiradores solitários, cujo
objetivo é apenas o maior número de danos possíveis, mais claro me
parece que vivemos uma epidemia local, quiçá mundial, de maus
tratos aos ser humano. Salvo se, em algum momento, algum médico da
área de medicina psiquiátrica possa afirmar categoricamente a
existência de algum transtorno mental claramente definido, o que
presenciamos hoje novamente não se trata de mocinhos e bandidos. Se
trata de educação ( ou a falta dela), de inclusão, de compreensão,
da presença efetiva de famílias, que hoje não podem contar com os
serviços básicos que o estado deveria oferecer: empregos fixos,
creches, salários dignos, saneamento básico, informação e, acima
de tudo, assistência social.
É
fácil cair na tentação de culpar jogos de videgame como fez esta
tarde o Vice Presidente Mourão e alguns comentaristas no Estúdio I
na Globo. Mourão chegou a afirmar que brincava saudavelmente na rua,
de bola, de queimada, ou algo assim. Pois é, também estou perto dos
60 anos e lembro-me bem de brincar, além de bola ou do pega-pega, de
mocinho e bandido. Também haviam as arminhas de brinquedo e eu vivia
matando alguém ( nem lembro mais quem eram os bandidos da época,
mas lembro que matei um bocado de gente…..). Para melhorar, meu avô
me deu em certa época uma espingarda de chumbinho, que hoje seria
considerado um brinquedo pra lá de politicamente incorreto. Nem por
isto, saí matando ninguém por aí quando cresci, tampouco meu filho
seguiu pelos caminhos do crime por ceifar várias cabeças em
Residente Evil, Assassins Creeds e diversos outros jogos. Pelo
contrário. Hoje ele dá aulas de Programação e Análise de
Sistemas em ensino médio e superior como concursado de uma Escola
Técnica.
Os
jogos, como qualquer outra atividade cumprem um papel catártico,
pedagógico e de criatividade que, se usados na medida certa, podem
ser de grande valia na educação infanto juvenil e não sou eu que
digo isto, são inúmeras pesquisas, nacionais e internacionais.
No
entanto, outro fantasma nos assombra. O fantasma da intolerância, da
impaciência, da incapacidade de ouvir o outro e por ele sentir
empatia. O fantasma de um estado que não sabe ainda como lidar com
os casos de bulling, que não sabe como orientar pais a respeito do
assunto, que tem pouco tempo, dinheiro e recurso humano capacitado
para lidar com isto. Junte-se à isso uma permissividade para ser
incorreto, vindo à cabo de um entendimento errôneo de que não
haverá mais punição para nada, a ideia de que tudo se resolve
armado hoje em dia, de que a vida humana não vale mais que um
chocolate e chegamos a um maléfico coquetel para o extermínio, em
escolas, igrejas, parques, ou em um simples assalto.
O
que ouve hoje foi muito, muito triste. Inominável. Adultos e
crianças tiveram suas vidas interrompidas sem motivo algum. Mas, com
o intuito de se evitar novos casos, cabe à sociedade entender o que
levou dois jovens a cometerem tal chacina. Porque eles não
levantaram de manhã, felizes da vida, cheios de alegria e amor pela
escola, família e amigos e apenas decidiram sair matando só porque
não tinham nada melhor para fazer . Há toda uma construção por
trás destas decisões. E é isso que cabe agora ser esclarecido.
Para
além destes esclarecimentos, deixo aqui minhas impressões sobre o
assunto. Bulling é coisa a ser levada muito a sério. Se isto
tivesse sido discutido na minha geração quando jovem, não teríamos
hoje tantos filhos desajustados, isto é fato pesquisado. Já passou
da hora de mudarmos o nome de “politicamente correto” para apenas
“correto”. Minha geração já viveu o suficiente para saber a
diferença entre o mimimi e a falta de responsabilidade social. O
mundo inteiro mudou, uma população vota pelo Brexit, outra se
manifesta contra a construção de um muro que separe um país de
seus imigrantes. As Coreias voltaram a se falar. Então você,
amiguinho, não vai morrer se tiver que morder a língua para não
fazer aquela piada de mau gosto sobre homossexuais no encontro de
funcionários da empresa ou tiver que parabenizar a mulher que ocupa
agora um cargo maior que o seu na sua empresa. São estes novos
ventos que temos que ensinar em nossas casas. Para os nossos filhos.
Ensinar que o mundo mudou. Que 2 mais 2 nem sempre será 4 e que
família pode ter mãe, irmão e 2 cachorros que será o mesmo que 2
pais e um filho, desde que haja amor, carinho e responsabilidade.
Não
sei exatamente se foi todo este ódio de quem nunca se reconheceu que
levou a matar 8 pessoas, mais suas próprias vidas, hoje na escola em
Suzano. Mas, senão foi ( e ainda acho que foi), que fique a dica.
Vamos ensinar nossos filhos, netos, sobrinhos, filhos de amigos,
amigos, vamos aprender, enfim, a amar. Vamos para com esta idiotice
de fla-flu odioso que se instalou neste país, e que serve de
desculpa para que passemos alfinetando uns aos outros o tempo todo.
Não
estou dizendo que não devemos ter posições políticas. As minhas
são bem claras e eu nunca as abandonarei. Apenas não perco meu
tempo caçoando e diminuindo quem não votou como eu. Ignoro, nem
respondo. Quando eu tiver que protestar, estarei na rua, bandeira em
punho, defendendo minha causa, justificando minha luta. Mas, não vou
perder meu rico e precioso tempo discutindo, ofendendo, depreciando
quem não quer enxergar o óbvio. Este desgaste não é meu. Assim
como ensinei meu filho a ignorar os comentários maliciosos, o
bulling maldoso e desnecessário, que hoje recebe como resposta o
fato dele ter se tornado alguém na vida, enquanto alguns dos que o
maltratavam sequer conseguiram uma carreira…. Ok, isto deve soar
muito errado, vocês vão dizer, mas devia ter chiado, reclamado…
Então,
foi chiado, reclamado, eu era aquela mãe que vivia na secretaria,
registrando queixas. Mas, aí você descobre que não é do interesse
da escola levar esta discussão à frente. Então, você passa a
ensinar a seu filho sobrevivência. Acho isto muito parecido com os
dias de hoje. Suas pautas não parecem ser respeitadas, ai você
ensina seu filho a cortar os pulsos ou a sobreviver isto? A
sobreviver, sempre a sobreviver!!!!
Não
acho que o mundo tenha mudado tanto. Acho apenas que esta geração
não aprendeu a se defender dos insultos, das diferenças, das
exclusividades, como as gerações passadas. Alguns, no entanto,
tempos atrás tiveram a exclusividade de ter pais com algum
conhecimento, o que os ajudou a sofrer um tanto menos. Outros, sem
qualquer apoio, saem matando a esmo, como se estivessem brincando com
a espingardadinha de chumbinho de meu avô, como se tivessem
aprendido que morrer lutando seria heroico, porque ouviram dizer que
isso era bonito ou a única solução. Ou, apenas porque tiveram medo
do que viria pela frente com uma prisão…..
Uma
coisa é muito certa. Precisamos unificar nossos discursos. Sendo de
esquerda ou de direita, contra ou a favor de certas liberdades civis,
precisamos aprender a lutar pelas nossas opiniões. E respeitar a
opinião do próximo. Apenas assim chegaremos a um patamar
civilizado, onde haverá espaço para discussões, sem ofensas, sem
ameaças, sem medo. Enquanto permanecer no país o clima de fla-flu,
de “nós odiamos vocês”, de “vocês não de direito de fala”,
nada irá mudar. Nesta escola, na escola vizinha, na reunião do
condomínio, no almoço entre amigos, no café da tarde entre
familiares, na cama entre marido e mulher….
Por
Deus, abandonem estas armas! Desarmem-se dos punhais, dos 38, dos
fuzis, das facas e das ofensas. Desarmem-se daquilo que mata o
próximo, mas não te traz vitória alguma. Que as mortes nesta
escola de Suzano nos façam lembrar que a morte é definitiva, cruel,
irreversível. Que tirar outra vida é algo que não nos cabe e que
cabe à Segurança Pública garantir nosso bem estar e não a nós
decidirmos quem vive e quem morre. Armar a população é delegar a
ela um serviço pelo qual efetivo do Estado já é remunerado para
fazer. Não cabe à população sair atirando em nome da defesa
própria!
Que
os falecidos de hoje sejam sempre lembrados por terem sido mortos
pelas mãos de quem possuía armas de forma ilegal e irresponsável.
E que suas mortes não tenham sido em vão!!!
Chega
de violência!!! Pelo fim das armas no país!!!!
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