domingo, 7 de dezembro de 2025

Jay Kelly - Ler o Filme Além do Galã

Assisti hoje na Netlix o tão criticado Jay Kelly, com George Clooney e Ben Stiller. Eu entendo que superficialmente pareça uma história de pobre menino rico, pois é a leitura primaria e mais óbvia. A Academia não gosta de histórias assim. Ela prefere histórias de superação, onde alguém, do nada, chega ao pico, dando enfase à meritocracia. Entendo esta visão. Dá muito ibope, porque dá enfase à superacao, incentiva a corrida ao impossivel e faz quem assiste sentir-se herói também, ja que se o personagem conseguiu, ele, telespectador, também pode. Ocorre que Jay Kelly nos da margem para outra interpretação também. Uma interpretação que me fez refletir e chorar ao final da exibição. Mais do que falar do bonitão cheio de dinheiro, sucesso e extremamente dependente de sua "entourage" até para amarrar os sapatos, o filme toca em um ponto muito comum a todos nós:o peso de nossas decisões tomadas em uma parte da vida que irá refletir futuramente, quando chegam os arrependimentos e nada do que possamos fazer pode mudar o que foi construido. Se Jay quis aproveitar a oportunidadede de sucesso quando ela se apresentou para ele e que ele agarrou com unhas e dentes, deixou para trás a oportunidade de ver suas filhas crescerem, afastou-se de seu pai e de bons amigos, sempre emendando um trabalho no outro. Com as filhas crescidas e donas de suas próprias vidas, o pai perto da finitude e empregados que cansaram- se de se dedicar a ele e suas exigências e necessidades, Jay se depara com as consequências de suas decisoes de vinte e tantos anos atrás.Está se sentindo sozinho, com ninguém íntimo o suficiente para dividir suas glórias. Interessante que seu empresário, o único que realmente é fiel e amigo a ponto de continuar ao seu lado, provavelmente estará vivendo o mesmo dilema futuramente, já que fica claro que ele também esta abrindo mão de sua familia em prol do amigo cuja imagem ele ajudou a construir. Ao final, ele observa como um presente, os fãs que assistem trechos de sua obra com um fascínio que serve de contra ponto às suas decisoes.Ele afinal, sacrificou muitas coisas em sua vida, mas, como dizia a saudosa Rita Lee, fez um monte de gente, que ele nem sabe quem é, feliz. O filme me fez refletir sobre minhas próprias decisoes, quando mudei-me de Estado e vim fazer minha vida em Vitorinha. Meu marido morreu, meu filho foi morar com a esposa em outra cidade, perdi o crecer dos meus sobrinhos, uma maior convivência com minha mãe e irmãos. Mas, curiosamente semana passada encontrei no Jardim da Penha a mãe de uma criança de quem eu fiz todas as festas de aniversario com meu pequeno buffet. Depois de saudosos abraços ela me mostrou a fota da Vitoria, hoje com vinte e nove anos e me disse que foram festas inesqueciveis (tanto que ela me contratou por dez anos seguidos). E nós despedimos, comigo tendo uma sensação de dever cumprido, de ter pertencido a alguma coisa na vida de alguém com meu trabalho. Por isto entendi tao claramente a sensação que Jay sentiu ao observar seus fãs, absortos naquela homenagem. Todo feito tem um preço e às vezes ele é pesado demais para carregar e impossivel de mudar suas consequências.Pena que boa parte da crítica só conseguiu absorver o lado "pobre menino rico" de George Clooney. Porque na vida real todos somos Jay Kelly! Ps.:nunca pensei que fosse dizer isto, mas Ben Stiller está cada vez melhor como atorde drama.Ele da um show como o empresário fiel e quase melhor amigo de George Clooney.