domingo, 26 de agosto de 2012

A BUNDA REAL




Minha timeline estes dias dias está lotada de palpites sobre a Bunda Real. Olhei com atenção aos primeiros posts para  ter certeza de que não seria injusta. 


Não, não serei injusta. Os jornais (on line ou não) deliciam-se em publicar a imagem de uma deliciosa bunda branca ( algumas cobertas com aquele indefectível recurso de imagem nublada, como se isso a  tornasse menos ofensiva aos mais sensíveis ou mais respeitosa ao interessado) como sendo a do Príncipe Harry durante sua estada em Las Vegas. Ou, de acordo com o ângulo, seus artefatos devidamente guarnecidos por um tímido par de mãos cheias de constrangimento. Alheia ao fato de que ele estaria desfrutando suas férias às custas de uma monaquia que existe muito antes dele ter vindo ao mundo, me pergunto porque tanto alvoroço.

Primeiro: é só uma bunda. Igual à sua, à minha, à do Ministro dos Transportes, à do Neymar, à do George Clooney, a do meu avô ( guardadas as proporções de idade e de cuidados estéticos, obviamente), apenas uma bunda, bem torneada, tenho que registrar, adequada à sua idade.

Segundo, ninguém nunca aqui foi solteiro? Ninguém nunca se divertiu aleatoriamente, todas as pessoas deste mundo sem fim tornaram-se adeptas à máxima bíblica da fidalidade pré casamento, assim, do nada? Ok, há que se dizer que ele é subsidiado pelos cofres públicos e o povo deve ter direito há opinar sobre seu comportamento. Será? Não há que se pedir demais de um jovem, na plenitudade da idade, que pare de se divertir? 

Não, não sou a favor da promiscuidade. Mas, me perdoem a palavra, o rabo é dele, ele faz do próprio o que bem entender. E quanto ao resto do equipamento ( que em nada parece deixar a desejar) também.

O assunto aqui é outro. Bem outro. O assunto aqui é a malfadada monarquia. É um país custear as obrigações e também as farras de um jovem que quando nasceu não escolheu ser o terceiro na linha de sucessão do reino. Se no berço lhe houvessem perguntado, talvez, apenas talvez, ele lhes dissesse: deixem meu equipamento em paz, vou trabalhar, como qualquer outro britânico do planeta e poderei assim, transar com todas as damas de Las Vegas durante as minhas merecidas férias.

A idade tem me tornado menos tolerante. Não tenho paciência para quem acha que um jovem da idade dele deve passar o dia inteiro lendo os ensinamentos do  Dalai Lama. Se ele trabalhasse e pagasse suas próprias contas, teria feito tudo o que fez sem dever nada a ninguém, como eu fiz, meu marido fez, como minhas amigas há trinta anos fizeram, e, como espero, meu filho esteja fazendo, sempre mais preocupado com a saúde (sua e de sua parceira) do que com o que os outros vão pensar dele.

É que é mais fácil culpar o sexo do que a monarquia. Além do que, vende muito mais jornal. Tudo na minha opinião modesta gira em torno da grana. Trabalhe, ganhe seu próprio dinheiro e você poderá bancar sua diversão ou fantasia, eis o que ensino ao meu filhote. E não se esqueça que diversões sem prevenção tem consequências irreversíveis. Feio não é trepar, feio não é se divertir com responsabilidade. Sexo é bom, é delicioso, quando feito com muita responsabilidade. Feio é não assumir as consequências dos seus atos. Feio é não poder bancar seus erros, não poder sustentar quem não pediu para estar aqui. Ou, no caso do príncipe, feia não é sua bunda e toda a sua área útil. Feio é divertir-se com o dinheiro do povo.

Não sei até que ponto ele tem culpa no cartório. Não sei, se ele pudesse escolher, se escolheria ser o terceiro na linha de sucessão e viver dos proventos da população.  E isso não é uma defesa ao seu comportamento, mas uma constatação. Não sei se trepar até não poder mais seria a sua prioridade. Só sei que o erro vem de outro lugar. A criatura já nasce e todos dizem: você será um exemplo, não fará nada diferente do esperado de um futuro príncipe porque vai comer, beber, vestir e transar com o dinheiro do povo. Se eu ouvisse isso desde os meus 2 anos de idade, provavelmente também acreditaria ter todos os direitos que me prometeram....

Em uma época de crise financeira sem fim na Europa, como avó e pretensa provedora - no sentido da prestação das contas reais, a Rainha deveria estar mais preocupada com o como estes gastos vão repercurtir do que como fica a imagem do príncipe, vestido ou despido, de frente ou de costas. E, por fim, que diabos de assessoria ela está pagando que não verificou se as pessoas com que ele estava se divertindo ( e vice e versa ) portavam câmeras, celulares e afins.


Se eu fosse ele, honestamente, arranjaria um emprego de verdade.  Para no próximo ano, poder jogar stripoker, stripsinuca, stripqualquer outra coisa e comer ( com o perdão da palavra) quem ele bem entendesse. E, mostrar, com o maior orgulho, a bunda real e seus demais apetrechos, sem qualquer constrangimento.....  , de preferência, com moças decentes o suficientes para não portarem uma câmera ou celular para valer-se financeiramente de sua  intimidade.

Mas, como de costume, é sempre mais divertido falar do superficial. Para que perder tempo discutindo se o povo deve se matar de trabalhar para sustentar não apenas as férias folgosas, mas TODAS as despesas da Família Real, suas moradias exuberantes, suas refeições nababescas, suas viagens oficiais, entre outras coisinhas. Melhor mesmo é estampar as estripulias constrangedoras do herdeiro desinibido e tudo bem. O resto não vai dar tanto ibope....

E podem me chamar de chata que eu não ligo! O que eu não aguento mesmo é falso moralismo! A bunda do rapaz é o de menos. Importa mesmo é quem vai continuar a pagando esta conta.....

Inté!


Débora








sexta-feira, 24 de agosto de 2012

FIC - PEDRAS NO CAMINHO - CAPÍTULO 10



“ SE AS ESTRELAS NÃO ESTIVESSEM ILUMINANDO O UNIVERSO NESTE MOMENTO, CERTAMENTE ESTARIAM ILUMINANDO MEU CORAÇÃO”. 

Fernando Lapolli




Emily Prentiss tomara um táxi até seu apartamento. Não iria até o escritório naquela hora para buscar seu carro. Estava cansada. Estava confusa. Estava excitada. Estava num estado Emily de ser dos últimos tempos. Durante toda a viagem tentou evitar o contato visual com ele. Sabia que ao menor deslize, todos perceberiam que havia acontecido algo além de George Foyet naquela penitenciária. O tempo não passava e ficar sentada ali, a poucos metros do homem que amava sem poder se aproximar dele, não ajudava muito. Precisava muito de uma bebida. Precisava ver aquele caso resolvido para que ele parasse de sofrer. Precisava dele em sua cama. Achou que tanto desejo pudesse ter contaminado sua percepção daquele olhar profundo que habitava os olhos de Aaron Hotchner. Não, não podia ter se enganado tanto assim. Ele teria pulado sobre ela ali mesmo se não fosse o homem respeitoso e responsável que ela tanto admirava. Mas aquilo podia ter sido uma reação momentânea, um misto de exaustão, raiva e necessidade de extravasar. Ele teria tempo para pensar, e quando pensasse, racionalizaria, e então.... Emily estaria ferrada. Aaron Hotchner pensando era sinal de que pesaria os prós, os contra, deixaria a culpa se instalar sobre a razão, avaliaria as conseqüências, pensaria de novo e deixaria a idéia de lado. E só restaria em sua lembrança a idéia de que um dia poderiam ter tido alguma coisa irresponsável e inadimissível. 



Emily pagou o taxista e desceu do carro. Enquanto caminhava em direção a seu apartamento e procurava as chaves dentro de sua bolsa, pensou que talvez, por um destes presentes do destino, ele pudesse estar em sua porta, esperando por ela, como naqueles filmes apaixonantes dos anos 50. Mas não havia ninguém à sua porta. Apenas a certeza de que ele tinha tido tempo demais para pensar naquilo tudo e desistir de qualquer idéia que, porventura, um dia tenha tido.


Emily entrou em seu apartamento, jogou a bolsa e sua pequena maleta em cima de uma poltrona e olhou para o relógio. Já estava bastante tarde. Um banho seria muito bem vindo, mas também uma bebida não seria ruim. Optou pelo banho, mas quando estava no terceiro degrau das escadas rumo a seu quarto, seu coração congelou. O som de uma batida na porta produziu o efeito de uma seringa com adrenalina. Não quis iludir-se, mas naquele horário, seria pouco provável qualquer outra opção. Desceu os degraus e caminhou em direção à porta, pedindo a todos os deuses que havia renegado um dia, que lhe atendessem às suas preces. Quando o viu pelo olho mágico, sentiu o sangue ferver em suas veias. Abriu a porta e viu um Hotch muito embriagado sem, com certeza, ter ingerido sequer uma gota de álcool. Embriagado de desejo. Seus olhos eram pura cobiça. Entreolharam-se por alguns segundos até que seus corpos não mais puderam se manter separados. Aaron abrigou o corpo de Emily com seu corpo, empurrando-o contra o batente da porta, selando seus lábios contra os dela, de forma brutal. Com pouco cuidado, as mãos de ambos passaram a explorar seus corpos antes mesmo que a porta do apartamento já estive fechada. Emily podia sentir a língua dele invadindo sua boca sem qualquer constrangimento.



Com a perna ele empurrou a porta que bateu atrás de si fazendo um barulho que lhes confirmou privacidade. Os olhos de ambos eram seus refúgios, abrigando os anseios daquele momento. Ela enfiou os dedos por entre as mechas de cabelo de seu homem e sentiu as mãos dele, firmes, mas impacientes, desvendando seu corpo, pouco a pouco. Como duas almas atormentadas no limiar da loucura, entregaram-se a carícias quase desesperadas. Hotch sentiu a mão de Emily correndo pelas suas costas, por baixo do seu paletó, tentando desvanciliar-se da peça. E depois sentiu que ela afrouxara o nó de sua gravata. As mãos só se separavam dos corpos para desabotoar, abrir ou fazer ceder as peças das roupas que usavam. Quando pôde derrubar a blusa que Emily vestia e sentir toda sua pele alva e macia, afundou-se naquele colo como sonhara tantas vezes. Ela era quente. Deliciosa. E seria dele. 


Ela o ajudou com o fecho e permitiu que a última barreira de tecido que se entre punha entre seus seios e a boca daquele homem caísse. Quando ele pousou seus lábios neles Emily já não podia sentir as pernas. Os joelhos tremiam. Sentiu –se úmida, inundada de prazer. E ele os explorou desesperadamente, com voracidade, apertando-se contra o corpo dela cada vez mais, até quase não poderem mais respirar. A madeira batia em suas costas para lembrar-lhe que aquilo era real. E seus olhos não se permitiam desviar dos olhos daquele a quem tanto desejara.


Emily o sentiu excitado. Era quase irreal poder sentir o desejo daquele homem despertando contra suas pernas. Tentou manipular o cinto, mas seus dedos foram afastados pela mão dele, que com muita facilidade livrou-se da peça. Quando sentiu a mão quente dele por entre suas pernas ainda sobre o tecido de sua calça, Emily resmungou algo quase inaudível.

-Aaron. Quarto. Já.



Ele a pegou no colo e a ergueu o mais próximo possível de seu corpo. Mas não estava disposto a desvendar os caminhos do quarto de Emily. Foi num sofá a poucos metros de distância da porta que ele deitou o corpo quente e cheio de curvas que ele trazia em seus braços. 


Em algum lugar de sua mente muito determinada, sentia-se culpado por privar aquela mulher de flores, beijos apaixonados e carícias delicadas, de uma cama quente com lençóis macios e palavras doces. Haveria espaço para isso um dia, ele tinha certeza. Ele saberia como compensá-la. Queria provar cada milímetro daquele corpo e sentir o gosto de Emily Prentiss. Mas não havia lugar para isso agora. Sentia a urgência de seu corpo cobrando-lhe a conta de tantos momentos de solidão, de tantos desejos reprimidos, de tanto não permitir-se ser feliz como merecia. E sentia que ela o acompanhava intensamente. Ele tirou-lhe a peça que lhe cobria as pernas e sentiu o sangue pulsar em seu membro dolorosamente. A visão daquele triângulo de renda preta cobrindo o pouco dela que ainda insistia em se esconder deixou-o transtornado. Despiu sua calça junto com sua boxer e sabia como queria acabar seus próximos minutos. Dentro dela. Dentro de Emily Prentiss. 


Ele a invadiu sem pudores, sem cuidados. Seco, duro, com uma batida forte e ritmada que Emily acompanhava com o corpo rijo, abraçada aos quadris de seu homem. Ele acompanhava o desejo cru estampado nos olhos dela , como se os dois não pudessem sobreviver a uma experiência daquela intensidade. A respiração de ambos foi ficando pesada, nenhum dos dois parecia mais ter controle sobre o que seus corpos faziam. Ela percebeu que ele estava em seu limite e ela mesma já não podia fazer retardar aquilo pelo qual havia esperado por tanto tempo. 


- Vem! – foi a única palavra que ela pôde pronunciar antes que uma onda de prazer invadisse seus corpos. E eles atingiram o clímax juntos, sentindo seus corpos à mercê de espasmos incontroláveis. 



Os minutos que se seguiram duraram uma vida inteira. A respiração foi ficando mais suave, os corpos suados e ainda trêmulos procuravam se ajeitar à posição um tanto incômoda que o móvel impróprio provocava e então sim, seus lábios se tocaram de forma carinhosa, num beijo longo, molhado e carregado de paixão.


Ela jogou duas almofadas sobre o tapete e ele entendeu o que o sofá estava ficando incômodo não só para ele. Carinhosamente ele a pegou nos braços e a deitou sobre a tapeçaria  de cor pálida, num silêncio que feria os ouvidos de tão intenso. Desta vez foi Emily quem puxou o rosto do agente para si e tornaram a beijar-se longamente, corpos entrelaçados. Então, como em seus pensamentos, Aaron Hotchner pôde buscar entre as curvas do corpo de Emily o descanso a muito desejado. E, como em seus sonhos, Emily Prentiss pôde encontrar o corpo de Aaron ao seu alcance ao esticar os braços.


-Emily, me...... – faltou palavras a ele. Tinha os olhos rasos d’água.
-Se você pedir desculpas eu mesma te mato! Ela sorriu carinhosamente.
- Me ajude.
- Sempre. Nada, nem ninguém, a não ser você, pode me impedir de estar ao seu lado, e ser seu céu, e ser seu chão. Ninguém pode tirar de mim o que eu sinto por você, o que eu estou sentindo agora.
-Vai ser difícil, haverão muitas pedras no caminho - ele disse com uma sinceridade impressionante - sou cheio de problemas, sou um homem complicado, você merece coisa melhor.
-Eu mereço o homem que eu amo. Eu mereço ser feliz ao seu lado. Nós merecemos ser felizes juntos. Pedras no caminho? Com elas vamos construir nossa vida juntos!

Ambos sabiam que o que vinha pela frente estava longe de ser algo fácil. Pelo contrário. Mas o que havia sido fácil em suas vidas até então?



Antes que pudessem se entregar a um merecido sono profundo, ele ouviu Emily rindo.

- Você podia ter me levado para meu quarto. Não teríamos que dormir nossa primeira noite juntos no tapete da minha sala de estar. – Ela puxou de cima de uma poltrona uma manta que cobriu seus corpos parcialmente e deu uma gargalhada deliciosa.
O som da risada de Emily. Ao lado do corpo de Emily. Seguido pelos olhos de Emily. Ele finalmente ia dormir em paz com música para seus ouvidos.

FIC - PEDRAS NO CAMINHO - CAPÍTULO 9



 

“Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já têm a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos.” 

Fernando Pessoa




Aaron Hotchner andava impaciente. Haviam já se passado alguns dias da sua conversa com Rossi no restaurante, mas tudo o que havia sido dito não lhe saía da cabeça. Ia e voltava do trabalho sempre pensando que aquele seria o dia em que teria notícias de Foyet, de que haveria uma pista, de que haveriam novidades sobre o caso. Mas não havia. Havia muito trabalho sim, mas nada que o levasse ao seu algoz. Hotchner era uma alma torturada vagando ora por entre as mesas do bureau, ora, por entre os móveis de seu apartamento. Nada lhe trazia um pouco de paz. Claro, estar entre seus colegas durante o expediente sempre distraía um pouco sua atenção. 

Às vezes divertia-se com alguma piada de Rossi, com as esquisitices de Garcia ou surpreendia-se com a inocência de Reid, mas era tudo superficial. Seu único alento era estar próximo de Emily. Em alguns momentos era apenas um olhar, às vezes ela passava por ele e perguntava se estava tudo bem, ao que ele sempre respondia positivamente. Em algumas ocasiões sentia uma enorme vontade de dizer: - Não, não está, podemos conversar? – mas achava aquilo tão inapropriado, tão descabido, que desconsiderava a alternativa antes mesmo dela virar uma opção. Mas gostava da idéia de tê-la por perto. E mesmo que ela nem imaginasse, ele a tinha em seus pensamentos em tempo integral.



Há algum tempo passou a considerar a possibilidade de imaginar sexo com Emily Prentiss. Nas noites mais cruéis, em que sua cama ficava pequena demais para tanto desespero, apegava-se à imagem desta mulher para seu conforto e seu prazer. Nas primeiras vezes foi muito difícil. Fora um homem pouco dado a grandes aventuras amorosas. Apaixonara-se jovem, se casara e fora fiel a uma única mulher por toda a vida até então. 

Não era comum, pois então, que tivesse pensamentos com alguém com nome e endereço conhecidos. Ela havia sido sua subordinada! Claro que tinha lá suas inspirações, mas elas eram sempre figuras anônimas, padrões de revistas das quais se tornara íntimo depois de seu divórcio. Nada que se comparasse a alguém com quem ele cruzava diariamente, que sentasse ao seu lado frequentemente e com quem discutisse motivações psicótico homicidas. Era uma coisa totalmente nova em sua vida. Imaginar sexo com Emily Prentiss. Imaginar se afundar em seu corpo quente até que tanto prazer lhe trouxesse alívio e o fizesse esquecer a dor de suas feridas. Tocar-se, até não poder mais sentir retido o grito e pronunciar o nome preso em sua garganta como quem implora por sua vida. Buscar entre as curvas de seu corpo o repouso merecido de alguém que não se sentia descansado havia muito tempo. Era cruel perder-se nestas divagações e pela manhã tratá-la como alguém a quem devia apenas respeito profissional. Era algo inusitado para o qual ele positivamente ainda não estava preparado, mas que também não podia evitar. 



Quando pela manhã foi comunicado de sua viagem para alguma cidade onde alguém estava dizimando famílias inteiras, pensou em seu filho. Sentia saudades e na verdade odiava crimes que envolviam crianças. Não podia haver nada mais odioso do que lidar com crimes contra crianças. Tudo o que via em sua profissão era de fato muito ruim, mas assassinos que dizimavam a inocência em sua mais pura essência eram os piores. Na grande maioria das vezes as crianças nem entendiam o que lhes ia acontecer. Não havia nada mais brutal do que ceifar uma jovem vida. Estes eram os casos que normalmente lhe despertavam mais motivação para o trabalho. E neste momento específico de sua vida estes casos lhe tornavam mais intenso, mais dedicado, se isso fosse possível.


Quando Morgan lhe pediu que visitasse Karl Arnold, um assassino que havia agido de forma similar no passado e podia estar recebendo correspondência de um imitador na penitenciária, de imediato solicitou que Emily fosse junto. Queria acreditar que a havia chamado porque ela pudesse lhe ser mais útil do que os demais agentes, mas no fundo, sabia que sua companhia lhe ajudaria a atravessar mais aquele difícil momento em seu dia. Já seria ruim o suficiente encarar Karl Arnold novamente, um sujeito asqueroso que obtinha prazer em dizimar famílias inteiras com toques de sadismo e barbárie sexual, e, claro, o miserável não deixaria escapar o fato de ele agora não usar mais sua aliança. A aliança era o troféu mais importante de Karl. Para ele também tinha um significado especial. Sempre acreditara no valor da família, na fidelidade e na dedicação a um relacionamento que, apenas por própria culpa, já não existia mais. A companhia de Emily certamente tornaria o episódio menos doloroso, além do fato dela ser uma excelente profissional e contribuir, com certeza, para a evolução dos esclarecimentos necessários para a resolução do caso atual.



Durante o caminho para a penitenciária, revisaram o caso de Arnold exaustivamente já que ela na época não fazia ainda parte do seu time. Procurou concentrar-se nos fatos, embora, em alguns momentos, fosse muito difícil não imaginar que poderia estar fazendo com Emily naquele momento, sozinhos no carro, coisas muito mais interessantes do que chafurdar-se na lama que era a vida de Karl Arnold.


Logo ao chegarem percebeu o quão difícil para Emily seria aquela visita. Atravessar aquele corredor cheio de pervertidos e malucos de toda a espécie já era muito difícil para ele que era homem, que diria para uma mulher bonita como ela. Quando ouviu Karl pronunciar seu nome, sentiu um embrulhar no estômago. Ele sabia que Emily era forte, mas Karl Arnold iria levar ao extremo aquela experiência.
Foram horas de provação, reviver aqueles momentos passados, pela boca daquele cretino.Ele saboreava cada palavra dita, cada evento lembrado. Queria ver fotos, se gabava pelos seus feitos e fustigava os agentes de forma primorosa. Chegaram a conclusões que levaram à captura da assassina, mas foi muito doloroso assistir a agente
enojar-se com tudo aquilo. E havia mais. Karl Arnold parecia não satisfeito em somente reviver seus crimes, mas parecia tripudiar Hotchner. Havia mais. O suspeito que havia feito contato com Arnold na penitenciária nada tinha a ver com os crimes que investigavam naquele momento, tinha a ver com ele. Parecia pessoal. Hotch começou a ter maus pressentimentos, sua mente começou a trabalhar rapidamente, tentou rever fatos, unir palavras, coisas ditas por Arnold que pareciam desconexas, mas que começavam a fazer sentido.



Ele vasculhou os papéis de Karl, suas anotações num caderno velho, até que encontrou por entre as páginas, uma folha dobrada que confirmou suas suspeitas mais insanas. Ele havia sido levado até Karl Arnold por obra e arte daquele que tornara sua vida um inferno na terra. Visto o símbolo rabiscado por sobre sua foto num recorte de jornal não precisou do nome pronunciado pela agente Prentiss para sentir uma pontada profunda em seu peito. O ar lhe faltava. Saiu transtornado daquela cela, deixando para trás um prisioneiro satisfeito em ver os efeitos que todo o plano provocara.


Emily tentava acompanhá-lo, mas Hotch tinha o passo pesado e acelerado, como alguém determinado a cometer uma loucura. Precisou correr para alcançá-lo. Chamou por seu nome duas, três vezes, mas era como se ela não estivesse em seu encalço. Ele parecia estar em outro mundo. Um mundo de dor, onde o limiar da loucura parecia colocá-lo à prova.

No estacionamento, ele esmurrou a porta do carro por várias vezes. Ela não sabia o que fazer. Então ela o tocou. Segurou-o pelo braço que ainda estava em movimento e que quase a tirara do chão e gritou seu primeiro nome:

- Aaron! Por Deus, sou eu, Emily! Me ouça! Tente se acalmar! Eu estou aqui! Olha para mim!

A força daquela voz ecoando seu nome, aos poucos foi fazendo-o recobrar o juízo. E não estava pensando com clareza quando a puxou para perto de si e a abraçou. Dias depois ainda não conseguiria dizer como não havia quebrado sua mão naquela hora, mas saberia dizer com certeza que o momento daquele abraço havia sido a coisa mais reconfortante que tivera nos últimos meses.


Pareceu durar uma eternidade, mas de fato, durou poucos instantes. Assim que pôde ordenar seus pensamentos afastou-se dolorosamente de Emily, sabendo que havia dado um passo que não teria volta. Tentou recompor-se, e pediu desculpas a ela. E antes que ela pudesse responder, voltou pelo mesmo caminho que havia feito para recuperar sua arma que ainda estava sob a guarda da administração da penitenciária.
 

Emily o seguiu em silêncio. Após recuperarem seus pertences, voltaram para o carro e ela tentou tirar a chave da mão de Hotch.


- Você não pode dirigir assim. Deixe-me levar o carro.
- Não, eu já estou bem. Me descontrolei, mas já estou bem. 

O que ele dizia, ele mesmo parecia não acreditar. Era como um pesadelo daqueles em que você quer despertar e não consegue. Ele pôs a chave na ignição, mas não ligou o carro. E falou, sem olhar para ela.


- Emily, me desculpe, não fui adequado, eu perdi a cabeça. Tudo o que está acontencendo.... estou muito envolvido emocionalmente. Me desculpe, não vai mais acontecer.
-Não, tudo bem. Você não fez nada! Este homem está levando você à loucura e acho que se fosse comigo eu já teria perdido a razão à muito tempo.
-Foi bom,..... você estar por perto.......
-Eu sei. Foi bom estar perto....
-Eu quero matá-lo! Eu sei que é errado, mas quero matá-lo! Ou estar morto, porque viver assim é o mesmo que não estar vivo.

Aquelas palavras atingiram Emily com brutalidade. 

-Não, você não pode querer isso. Você está vivo. Pessoas dependem de você. Pessoas lhe querem bem!
-Quem depende de mim? Meu filho e a mãe dele estariam vivendo melhor se eu estivesse morto. Levam uma vida de privação porque eu não fui capaz de protegê-los e estariam livres para viver suas vidas se eu me fosse. Eu não consigo me olhar no espelho, Emily. Ponho a vida de minha equipe em risco todos os dias apenas por os estar acompanhando. Para quem eu sou útil vivo?



Aquelas palavras bateram em Emily com a força de uma marreta. Ela queria tomá-lo para si, queria poder confortá-lo, mas sabia o quão inapropriado aquilo parecia naquele momento. Não podia prever como ele reagiria. Decidiu esperar. E veio o silêncio. Por alguns minutos foi como se lessem os pensamentos um do outro sem que palavras fossem ditas. Porém, quando se entreolharam havia fogo em seus olhos. Havia desejo. Um desejo ardente, desesperado. Não havia nada de meigo ou carinhoso naqueles olhares. Eram olhares de necessidade, de urgência. Eles sabiam o que queriam. Sabiam que era errado. Sabiam que isto mudaria suas vidas. Mas já haviam decidido. Era uma questão de tempo.
Emily, sempre tão cheia de palavras, naquele momento, mal podendo respirar, apenas conseguiu murmurar : - Apenas nos leve daqui!

Ele ligou o carro e partiram em direção ao grupo, que os esperava no hangar. Já no avião, Hotch sentou-se distante de todos e coube a Emily descrever aos seus colegas o que tinha acontecido. Claro que todos compreenderam porque ele estava daquele jeito. Morgan fez menção de levantar-se para conversar com ele, mas Rossi o impediu.

- Não é inteligente falar com ele agora. Ele precisa por suas idéias em ordem. Precisa de tempo para dissipar sua agonia. Deixe-o em paz por ora.



Emily agradeceu emudecida pela decisão de Rossi. Sabia que naquele momento tudo que ele precisava era ficar sozinho. Bastava ela, ter sido tão dissimulada, para tentar não transparecer tudo o que se passara entre eles alguns minutos atrás. Era muita coisa para absorver. Sentia-se aflita por ele, mas sentia-se feliz, por saber que aquele desejo não era só dela, que eles partilhavam aquilo.

Aaron Hotcnher tinha seus olhos fechados e seus pensamentos voltados para os acontecimentos das últimas horas.Sabia que enlouquecê-lo era o objetivo de George Foyet. Pressentia que dali para frente as coisas só poderiam ficar piores. Então focou-se nos olhos de Emily Prentiss. Olhos cheios de desejo que pareciam ter vida própria. Os olhos de Emily. O sorriso de Emily. O corpo de Emily. Tudo que ele precisava para se manter vivo de novo. Ela o iria ajudar a reinventar-se, se não fosse por ele, que fosse por seu filho, pela mãe de seu filho. Ou, por ela. E lembrou-se das palavras de Lao Tse: “ser profundamente amado por alguém nos dá força; amar alguém profundamente nos dá coragem”.

Ao desembarcarem, já tarde da noite, cada membro do time seguiu para suas residências. Todos só queriam ir para casa. Todos. Menos Aaron Hotchner. Ele sabia bem para onde deveria ir agora.

FIC - PEDRAS NO CAMINHO - CAPÍTULO 8



"(…)
Que dias há que na alma me tem posto
Um não sei quê, que nasce não sei onde,
Vem não sei como, e dói não sei porquê."
…porque o amor é assim mesmo…
Sente-se…apenas!”


Luis de Camões



Ao entrar no avião, Emily Prentiss constatou o inevitável. A cadeira ao lado de Aaron Hotchner estava vazia e não havia grande número de opções disponíveis. Todos esperavam que se sentasse ao lado dele, como fizera dezenas de vezes nos últimos anos. Todos esperavam pelo óbvio e não fazê-lo seria ainda mais óbvio. Sentou-se, mas procurou não olhar para os lados. E não pôde esperar para que os outros se manifestassem. Lembra-se de ter feito um comentário sobre a cor dos olhos das vítimas e só sentiu-se mais tranqüila quando todos começaram a discutir as possibilidades do caso. Começou a sentir-se mais à vontade à medida que a conversa esquentou, mas não pôde deixar de sentir uma pontada de dor quando ouviu JJ dizer que as famílias queriam falar com o líder deles. Sentiu uma vontade imensa de olhar para ele naquele momento, de apoiá-lo, pois sabia o que ele devia estar sentindo, mas engoliu em seco suas lamentações e prosseguiu com as discussões sobre o caso. Para seu alívio, não iria acompanhar Hotch à delegacia o que lhe dava algum tempo para se recompor adequadamente. 



Nos momentos em que esteve sozinha, Prentiss procurou pôr seus pensamentos em ordem. Em que momentos deu sinais a Hotchner de que estava preocupada a ponto dele tranqüilizá-la particularmente? Tinha certeza de que não estava sendo inapropriada, de que sua conduta estava dentro dos padrões aceitáveis de uma agente preocupada com um colega de trabalho que estava passando por um momento difícil. Droga! Odiava admitir, mas deveria ter dado muito na vista para ele comportar-se assim. Precisava consertar isto. Mas não podia negar o efeito devastador daquele sussurrar em seu ouvido.


- Vai dar tudo certo! – Quatro palavras ditas de forma tão acalentadora que não sabia o que era pior, o medo pelo motivo pelas quais haviam sido proferidas ou o impacto que o murmurar deste homem havia produzido, fazendo-a sentir-se quente, muito quente em pleno horário de trabalho. E o que foi aquele toque em seu ombro? Leve e rápido, mas ela poderia descrevê-lo por uma eternidade. Ele a havia tocado. Aaron Hotchner não fazia isto. Nunca. Foi um toque íntimo, como se quisesse protegê-la de todos os males do mundo. Não compreendia bem os efeitos de tudo aquilo, mas tinha a certeza de aquilo não havia terminado ali. E gostava disto. 



Quando chegou à obra abandonada, viu que Hotchner havia feito seu trabalho. Morgan ficou indignado com Hotch pelo seu comportamento, mas ela sabia bem que aquilo era apenas uma pequena inversão de papéis. Morgan estava experimentando aquilo pelo qual seu ex-chefe passara diversas vezes. E aquilo era inusitado. E divertido. Morgan olhou para ela na esperança de uma ajuda, de uma aprovação, mas Emily não tornaria as coisas mais fáceis para Morgan. Preferia abster-se de qualquer comentário. Quando Morgan afastou-se, Hotch lançou para ela um olhar divertido, que há muito ela não via naquele homem, e não pôde conter um breve sorriso. Ele afastou-se rápido, murmurou alguma coisa, mas ela poderia jurar que havia algo ali, o olhar de um Hotch que a via de uma forma diferente de alguns dias atrás. Tudo bem, havia a adrenalina de pegar o cara sozinho, e ele precisava desta descarga, havia a insolência de um subordinado quase rebelde, que ele há tempos não podia se dar ao luxo de ser, mas não era só isso. Havia algo mais. Ele a notara. Ele a tocara. E agora, ele sorrira para ela.

A viagem de avião pareceu mais longa na volta. Assim que pôde, sentou-se ao lado de JJ, que tirara da carteira uma foto muito linda de seu filho e ficara a admirá-la.

 
-Ele é um bom motivo para voltar para casa,não é?
-É, ele é meu melhor motivo – JJ estendeu a foto para Prentiss que a pegou.
- Ele está lindo! Aposto que você sente falta dele o tempo todo.
- É difícil sair de casa pela manhã e deixá-lo. A babá é ótima, mas está longe de ser a mesma coisa.
-Eu entendo. Por isso acho que filhos não combinam comigo. Acho que enlouqueceria longe deles.
-Ao menos o Will me apóia. Na verdade ele está tentando uma transferência para cá, pois está muito difícil para todos nós com ele longe.
-É, é bom ter um homem ao seu lado para apoiá-la.
-Emily, você sabe que não é crime se apaixonar, não é?
-Do que você está falando?
-Dele! – JJ fez um gesto com a cabeça, indicando umas poltronas atrás, onde Hotch descansava.



Emily gelou. Não podia acreditar que iria ter esta conversa.

-Sou tão óbvia assim?
- Bem, eu percebi, acho que não fui a única. Todos nós estamos preocupados com ele, mas você se entrega no olhar. Mas ele não parece ter notado. Está com outras coisas na cabeça.
-Ahn!
-Ninguém aqui a recrimina. Ninguém escolhe por quem se apaixonar. Com você não é diferente. E ele é um bom homem. E está precisando como ninguém de alguém que o conforte. Toda esta situação com o Foyet, com Jake, isto deve estar enlouquecendo-o. Talvez, se você se aproximasse, isso não fosse de todo ruim.
-JJ, está maluca? Ele é meu chefe. Quer dizer era. Quer dizer, espero que volte a ser. Ah!, você me entendeu!
-E daí?
-Como, e daí? E todo aquele papo de relacionamento entre agentes e tal? Acha que eu posso arriscar todo este constrangimento?
- Emily, você é tão inteligente, será que não pode parar para raciocinar somente um instante? Vai me dizer que ninguém dorme com ninguém dentro do FBI? Você nunca ouviu falar do agente Dawson? Dizem que ele vive com a agente Forlay há três anos e embora nada seja oficial, parecem muito felizes. E este é apenas um caso. O que eu ouço na minha mesa......Vai dizer que você também não ouve!
-Olhe JJ, ele está me enlouquecendo mesmo, não vou negar, tenho tido dificuldades em manter isso em segredo e pelo visto, não tenho obtido sucesso. Sonho à noite com ele, acordo e não consigo dormir novamente, tenho dificuldade em me concentrar, está muito difícil trabalhar ao lado dele, mas daí a chegar para ele e dizer que estou apaixonada, vai uma distância de quilômetros.
-Bom, não precisa ser assim. Vocês estiveram bem próximos durante a recuperação dele, isto pode ser um bom gancho para você se aproximar dele, deixá-lo falar, desabafar. Ele deve estar precisando. E você é mulher, sabe como fazer essas coisas.
- É, sei mesmo. Achei que guardasse o maior segredo do mundo e você me diz que não há segredo nenhum. Sou mestre nisto. Não acredito que todos saibam!
-Eu não disse que todos sabem. Apenas que desconfiam.


-Todo mundo?
- Hum, hum!
-Rossi também?
-Acho que sim.
-Tô ferrada. E Garcia. Ela percebeu. Dela eu tenho certeza. Veio falar comigo que o Hotch ia ficar bem. Ela sabe.
-O Morgan tem quase certeza.
-E o Reid?
-O Reid, bem, o Reid é o Reid, você sabe, coisas do coração para ele têm que ser gráficas, senão ele não percebe. Nem se preocupe com ele.
-O que você faria no meu lugar?
- Não sei, talvez desse tempo ao tempo, mas sem abandonar meus objetivos.
-Acho que ele ainda sente alguma coisa pela ex dele.
-Não, ele está abalado porque se sente culpado por ela ter se tornado uma vítima do Foyet, mas não acho que ainda exista algum sentimento aí. É só culpa. Acho que ele foi muito apaixonado por ela, mas agora o que restou foi este sentimento de culpa pelo que está acontecendo. Ele deve ter sofrido muito com a separação, mas acho que superou isto.
- Pode ser. Sabe JJ, eu tenho uma coisa de só me apaixonar por caras errados, tenho um radar ativo para canalhas de carteirinha, caras que só me fizeram sofrer. Pela primeira vez em minha vida me apaixonei por um cara decente e já sabemos quem ele é e como vai ser difícil fazer isto dar certo. Por que eu deveria insistir neste sentimento que tem grandes chances de ser unilateral?
-Se eu disser para você desistir deste sentimento você vai deixar de sonhar à noite com ele? Vai deixar de acordar encharcada de suor? Vai deixar de sentir calafrios quando ele chegar perto de você? – JJ olhou para ela com uma sobrancelha levantada e um sorriso no rosto.
-É, foi o que pensei. Então, por que não tentar?

O avião pousou e elas se despediram.

Emily foi para casa pensando no que JJ havia dito. Diabos! Ela sempre complicava tudo. Por que se apaixonar pelo chefe? Tá, ela sabia que ele não era mais seu chefe, mas e daí? Ela sempre o veria como chefe. E agora, todos sabiam o que sentia. Nunca se sentira tão exposta. A enigmática Emily Prentiss transparente como água em um copo.Entrara para o BAU para se provar como profissional inquestionavelmente competente e não para sentir-se vulnerável às travessuras de seu coração. Como seria daqui para frente? Bom, se todos sabiam, ou ao menos desconfiavam, já não tinha muito a perder. Não queria por em risco seu emprego já que lutara tanto para estar lá, mas não podia deixar de lutar também por seu coração, tão sofrido e solitário. Já não era uma menina. Quanto teria de esperar para ter ao seu lado um homem que a amasse de fato e que aquietasse seus anseios?

Chegando em casa, enfiou-se em um banho muito bem vindo. Deixou que a água morna lhe desenhasse o corpo por minutos e imaginou que ele poderia estar ali, ao seu lado. Ouvia sua voz murmurando: - Vai dar tudo certo! - E quase podia sentir sua barba por fazer roçando em seu pescoço. Era como se sua mão nunca tivesse saído de seu ombro. Estava enlouquecendo. Permitiu-se ter prazer prolongando a presença daquela mão no seu corpo, daquele respirar quente em sua nuca, daquelas palavras em seu ouvido. Sentia-o tão presente que ao atingir o clímax murmurou seu nome : Aaron. E quando terminou, tudo o que queria é que ele estivesse lá para chamar por seu nome também.

Ela precisava daquilo para se manter viva. Ela precisava daquilo para mantê-lo vivo. Ela sabia o que fazer. Não seria fácil. Mas o que tinha sido fácil para Emily Prentiss até então?

FIC - PEDRAS NO CAMINHO - CAPÍTULO 7



"PARA OS ERROS HÁ PERDÃO; PARA OS FRACASSOS, CHANCE; PARA AMORES IMPOSSÍVEIS, TEMPO. DE NADA ADIANTA CERCAR UM CORAÇÃO VAZIO OU ECONOMIZAR ALMA. O ROMANCE CUJO O FIM É INSTANTÂNEO OU INDOLOR NÃO É ROMANCE. NÃO DEIXE QUE A SAUDADE SUFOQUE, QUE A ROTINA ACOMODE, QUE O MEDO IMPEÇA DE TENTAR. DESCONFIE DO DESTINO E ACREDITE EM VOCÊ. GASTE MAIS HORAS REALIZANDO QUE SONHANDO, FAZENDO QUE PLANEJANDO, VIVENDO QUE ESPERANDO, PORQUE EMBORA QUEM QUASE MORRE ESTEJA VIVO, QUEM QUASE VIVE JÁ MORREU."

Luis Fernando Veríssimo



Aaron Hotchner foi o primeiro a sair da sala. Fora mais fácil do que imaginara. Como havia previsto, seu pessoal não contestara seus motivos e respeitara sua decisão com alguma tranqüilidade. Sentia-se mais leve agora que havia comunicado sua decisão a todos. Havia um longo caminho a ser percorrido, mas ele havia dado o primeiro passo. Já estava a caminho do elevador quando deu por falta de seu celular. Ao virar-se para voltar à sua sala encontrou uma Garcia muito constrangida lhe dirigindo a palavra.

- Sr, isso pode não ser muito adequado, mas a agente Prentiss está muito preocupada com o sr. Todos nós estamos mas, bem, eu achei que o sr. deveria saber...

Garcia saiu em disparada antes que Hotchner pudesse processar a informação e apesar do seu embaraço, tinha no rosto ainda o mesmo sorriso vitorioso. Sabia que estava fazendo a coisa certa.
Em outras circunstâncias ele teria odiado o comentário de Garcia, afinal sempre fora avesso a fofocas e comentários pessoais dentro do ambiente de trabalho, mas o nome de Prentiss lhe fizera prender a respiração. Não era o momento para tentar entender porque isso era tão relevante mas, num impulso pouco típico de sua conduta, Hotch, após pegar seu celular, localizou Prentiss, aproximou-se dela, apoiou uma mão muito levemente em seu ombro e quase como se não pudesse controlar o que viria a seguir, murmurou em seu ouvido: 

- Vai dar tudo certo!



E muito rapidamente seguiu em direção ao elevador. Ao entrar dentro dele seus pulmões agradeceram por ele respirar novamente. O que fora aquilo? O que fizera? Por que não a chamara em sua sala para perguntar o que estava acontecendo, para pedir que não se preocupasse com ele? Por que agira como um colegial, esquivando-se de olhar nos olhos daquela mulher cuja presença o perturbava tanto nos últimos tempos? Que diabos, com todos os problemas que tinha não podia se dar ao luxo de arranjar mais alguns. Iriam em instantes sentar-se lado a lado no mesmo avião e ele não sabia bem como ela teria entendido o que havia feito. Nem ele entendia. Apenas havia feito. Tinha tido uma enorme necessidade de dizer a Emily Prentiss que tudo daria certo como se quisesse endosso para suas palavras, como se esperasse que alguém lhe dissesse, - Sim, você tem razão, tudo vai dar certo!


Maldição! Ele a havia tocado! Não havia nada mais inapropriado. Não era dado a intimidades deste tipo com seus agentes. Ela era uma subordinada. Bom, tecnicamente ela não era mais uma subordinada, mas isso era irrelevante. A verdade é que apesar de extremamente inadequado, não podia negar que havia sido algo inesperado, mas tremendamente prazeiroso. Ele não podia permitir que Emily Prentiss ficasse preocupada com ele. Tinha sido elegante e adequado acalmá-la. Bom, não precisava ter sido daquela forma, mas não podia negar que o que havia feito, de certa forma, também lhe tranquilizara, também lhe fizera bem. 

Agora estava feito. Esperava apenas não ter sido interpretado errôneamente e não passar por constrangimentos na próxima hora ao seu lado.



Já no avião, Hotch procurou apenas pensar no caso que tinham que resolver. Nada de Foyet, Strauss, ex mulher, Jack, Emily. Apenas um maldito maluco enucleador. 
Sentou-se primeiro, na janela, mas Emily foi a última a entrar no avião e, para juntar-se ao grupo, o lugar mais provável seria ao lado do seu, que ainda estava vazio. Sentiu um embrulhar no estômago. Respirou fundo e voltou a pensar no caso. Sentiu-se um pouco desconfortável quando JJ disse que a família queria conversar com o líder da equipe. Era difícil não reagir a este tipo de situação. Mas, não podia deixar que eles percebessem seu desconforto. Também se preocupava em como Morgan iria se sair , queria deixá-lo à vontade, não poderia se dar ao luxo de demonstrar qualquer reação.
 
Era um caso difícil e o perfil parecia não bater. Morgan insistia em não atender aos telefonemas de Strauss e ele sabia que tinha que intervir. No entanto, não ficou surpreso quando Morgan priorizou o caso e postergou a conversa com a Chefe. Rossi estava certo. Morgan estava se saindo muito bem e tinha tudo para se adequar à chefia e seria difícil reverter a situação. Estranhamente, Hotch não se sentiu preocupado com isso. Ficou feliz em ver seu menino saindo-se tão bem na função que ele escolhera lhe confiar e pela primeira vez em muitos anos não sentia sobre si o peso do cargo. 
 
Quando finalmente ouviu os gritos daquela mulher vindo da obra abandonada e pôde por as mãos naquele canalha, nem por um momento pensou que poderia estar fazendo algo errado. E surpreendeu-se com o comentário de Morgan sobre seu comportamento.


-Bratley disse que você o pegou sozinho.
- Ele não estava atrás de mim.
- Deveria ter esperado por reforços.
- Você teria esperado?



Morgan olhou para Emily esperando pela aprovação de seu comentário, mas a agente limitou-se a observá-los, e quando seu colega ficou sem resposta e se retirou, Hotch percebeu um leve sorriso nos lábios dela. Ele achou que ela estava se divertindo com a situação e de uma forma quase atrevida ele revidou o sorriso perguntando se havia algum problema. Mas, não esperou pela resposta. Sabia que havia feito a coisa certa. Sabia que ela o entendera. Só não sabia porque isso lhe parecera tão importante. Aparentemente estava tudo bem entre eles e isso o deixou aliviado. Aquele quase sorriso da agente Prentiss havia alegrado seu coração. No entanto, seu bom senso lhe disse para ignorar aquela sensação, afinal, já tinha sorte por não ter sido mal interpretado pela colega horas antes.


Hotch voltou para seu escritório e embora não tivesse relatórios para preencher, também não tinha muito porque ir para seu apartamento correndo. Ficou revisando as pastas do caso de Geoge Foyet por mais de uma hora. Observou de sua mesa que Morgan ainda estava trabalhando e viu quando Garcia se afastou da sala com o agente. Provavelmente para lhe mostrar sua nova sala, como JJ havia lhe confidenciado horas atrás. Penélope Garcia. Criatura estranha esta menina. Gentil e dedicada com todos que a cercavam. Uma alma boa que habitava aquele prédio. Foram as palavras de Garcia que o levaram a procurar por Emily no início do dia. Por que ela havia achado importante dizer tal coisa a ele? De qualquer forma, tinha sido uma coisa boa. Ele havia se comportado de maneira meio estranha, mas sentia-se bem com tudo aquilo. Estava cansado e merecia uma cerveja. E algo para comer. Fechou as pastas, apagou as luzes e foi até o estacionamento pegar seu carro.

- Hotch! Ainda por aqui? A voz de Rossi vinha da parte de trás do estacionamento.
- Rossi, achei que tivesse ido embora há horas!



- Já estava dentro do carro quando recebi um telefonema de um amigo, agente Swennen, pedindo umas opiniões sobre um caso. Então, acabei voltando ao quarto andar para conversar com ele e estou saindo só agora. Uma cerveja?
-Na verdade estava indo mesmo comer alguma coisa.
-Ótimo! No Brandon’s está bom pra você?
-Pode ser.
-Nos encontramos lá.


No caminho, Hotch foi pensando em seu amigo. Era um cara que sabia se divertir mas, no fundo, também muito sozinho. Será que as pessoas que passavam horas a fio envolvidas com crimes hediondos, barbáries, e toda a espécie de desgraça alheia estavam todas fadadas a serem pessoas solitárias? Era muito difícil não levar para o reduto de um lar todas as coisas escabrosas com as quais eles conviviam diariamente. Enquanto esteve casado sempre procurou deixar seu trabalho na soleira da porta de casa, mas sabia que não era bem assim. Era difícil não afetar as pessoas ao seu redor com o lado escuro com o qual conviviam. E, sejamos sinceros, ele nunca deixou o trabalho na soleira da porta de casa. Não podia recriminar Haley, principalmente agora, com tudo que ela estava passando por sua causa. 
Quando estacionou, viu Rossi à sua espera na porta do bar. Entraram juntos, pegaram uma mesa e fizeram o pedido à uma garçonete muito magra e de seios fartos que repetia pausadamente tudo o que estava anotando no seu bloco de pedidos. Ela afastou-se e Rossi riu.

- Belos seios, mas tomara que ela traga nossas cervejas mais rápido do que ela escreve.
-Você não deixa escapar nada não é?
-Diga que não é divertido! E então, como você está se segurando?
-Na verdade, apesar das circunstâncias eu estou bem. Tenho procurado manter-me ocupado para não pensar muito em tudo o que tem acontecido.
-Tem dormido?
-Um pouco. Sinto saudades de Jack. É difícil Rossi, muito difícil.
-O agente Marshall tem te posto a par da situação?
-Sim, na verdade eles mudaram Haley de cidade novamente. Ela é teimosa, Rossi, não entende que não pode ligar para a sua mãe, que não pode fazer qualquer contato. Mas Marshall me garantiu que eles estão bem e protegidos. Tenho que acreditar nisto senão enlouqueço. Há noites em que acordo achando que Jack está nos pés da minha cama, me chamando. É difícil.


-Você devia sair um pouco. Há quanto tempo você não tem um encontro?
-Rossi, qual é, você acha que tenho cabeça para isso? Meu filho e minha ex mulher estão vivendo escondidos por minha causa....... 

Hotch interrompeu o que dizia enquanto a garçonete deixava em sua mesa a cerveja e os pratos pedidos. – Você acha que eu posso sair com uma mulher?

-Eu sugeri um encontro, não mandei você entrar em uma capela em Las Vegas e se casar com alguém sob as bençãos de um padre vestido de Elvis. Apenas sair com uma mulher, ser feliz por umas horas. Não me venha dizer que é a preocupação que impede você de fazer isso. Dormir ou não com uma mulher não vai impedir você de ter seu filho de volta. Isso é só sua consciência. Você não tem culpa pelo que aconteceu. Não tem que se culpar. Não escolheu que isto acontecesse. Não negligenciou. Não deu motivos. Já conversamos sobre isto outro dia. Você não é o cara mau. George Foyet é. Você deu à sua família toda a dedicação que pode, mas não pode evitar que isto acontecesse. Deixar de viver a vida, deixar de ser feliz, não vai fazer você se sentir melhor.

Hotch bebeu cada palavra de Rossi com a mesma sede que bebeu sua cerveja. Olhou para o amigo com certa curiosidade.

-Você é feliz?
-Vivo momentos felizes. Aproveito intensamente o que a vida me oferece e não fico angustiado esperando que essa sensação vá durar para sempre. Depois de três casamentos você aprende.



Hotch sorriu. Cortou seu filé mas, não pode deixar de engasgar quando ouviu a pergunta de Rossi.

-Aconteceu alguma coisa entre você e Emily enquanto você esteve afastado?
-Claro que não! Está maluco? Ela apenas foi gentil comigo, ligou para mim algumas vezes depois que saí do hospital, me deu carona nos meus primeiros dias de retorno ao trabalho e só. Por que?
-Porque ela está visivelmente atenta a você, tem te acompanhado de perto, parece que só você não percebeu isso ainda.
-Como assim? Só eu não percebi?
- Hotch, somos profiles, traçamos perfis, vivemos de prever o próximo passo de um ser humano e, embora tenhamos acordado não fazermos perfis uns dos outros, Emily tem sido óbvia demais para todos na equipe.
-Óbvia? Em que? Pra quem?
-Amigo, só você não notou ainda que ela é apaixonada por você. Ou não quer notar. – Rossi brincou com o garfo no ar como se a reação de espanto do amigo o divertisse.

- Ela ia se demitir para não prejudicá-lo. E só não o fez porque você a convenceu do contrário. No que dia em que você foi atacado ela foi a primeira a ficar incomodada com a sua ausência, foi a primeira a ir atrás de você, ficou de plantão naquele hospital até ter certeza de que você estava realmente bem. Rapaz, todos nós ficamos preocupados como amigos, mas só ela ficou em pânico como mulher. Ela tem vigiado seus passos de perto, sofrido com a sua dor. Você deveria já ter notado.



-Bem, na verdade, ultimamente eu também tenho pensado nela mais do que gostaria. Ela é uma mulher bonita, inteligente, fascinante. Mas, não posso pensar nisso agora. Tenho outras prioridades. Além do mais Rossi, você sabe qual a política do FBI para relacionamento entre colegas de trabalho.

-Hotch, o FBI tem mais de trinta e hum mil funcionários. Você realmente acredita que neste momento não há nenhum deles dormindo com um colega de trabalho? Não seja ingênuo. Oficial ou não, é certo que um relacionamento com pessoas que tenham o mesmo tipo de atividade que o outro facilita a compreensão de determinadas coisas, principalmente no nosso ramo. Não estou dizendo que você não tenha outras prioridades. Mas ela é uma mulher interessante e apaixonada. E será uma ótima ouvinte. Seja benevolente consigo próprio e dê-se ao direito de se distrair um pouco. Escute o que eu te digo: a vida não te oferece chances para rascunho. O que você faz, está feito, o que deixa de fazer, só te fará lamentar depois. 


Ele estava confuso com tudo o que o amigo lhe dizia mas, ao mesmo tempo foi como lhe ensinarem a escrever seu nome. Nada que ele já não soubesse, embora relutasse em admitir. Somente a informação sobre Emily lhe surpreendera. 
Após acertarem a conta caminharam até o carro de Hotch onde Rossi despediu-se.


-Vá para casa e pense em tudo o que te falei. Ou melhor, não pense. Seu problema é que você pensa demais. Vá descansar.
-Rossi, obrigado amigo. 

Hotch já estava dentro do carro quando Rossi recuou um pouco e se aproximou da janela. 

-Nós vamos pegá-lo, Hotch, nós vamos pegá-lo.

Aaron Hotchner dirigiu até sua casa revendo cada palavra dita por seu amigo durante o jantar.
Emily Prentiss. A voz que lhe parecia música para seus ouvidos e embalava seus sonhos. Seu olhar intenso. Seu corpo. Seu sorriso. Sim, ele também estava apaixonado por Emily Prentiss. Sabia que seria difícil lidar com isto, principalmente neste momento, mas o que havia sido fácil em sua vida até então?

FIC - PEDRAS NO CAMINHO - CAPÍTULO 6





 

OS HOMENS SÃO FEITOS DE MANEIRA A RESISTIR A UM SÓLIDO ARGUMENTO, MAS A CEDER A UM SIMPLES OLHAR. 
 
Honoré de Balzac



Emily despertou em sua cama totalmente encharcada de suor. Com um movimento puxou o despertador para perto de si para descobrir que ainda eram 2:56h e a madrugada estava apenas começando. Acontecera de novo. Estava sonhando com ele. Não lembrava-se com exatidão do que o sonho tratava, mas tinha certeza de que o corpo do homem que amava estaria ao seu alcance ao despertar. E esticou os braços por sobre os lençóis só para ter a lamentável constatação de que estava sozinha. Emily ficou deitada mais uns minutos, olhando para o teto de seu quarto. Havia sido um sonho quente. Bocas se unindo, corpos ardentes, promessas e juras, palavras inconfessáveis, mãos que deslizavam e se tocavam a todo instante. Ela quase podia sentir as mãos de Hotch, suaves, mas muito firmes, ainda em seu corpo. Havia sido um sonho quente. 


Levantou-se e bebeu água, toda a garrafa gelada que encontrou em sua geladeira. E ficou olhando pela janela. Na rua, uns poucos carros ainda iluminavam o tapete negro que se estendia para longe. Mas o silêncio reinava. Poucos ruídos chegavam ao seu ouvido. Emily pensou no quão ridícula ela estaria parecendo naquele momento. Sentiu-se de volta ao campus de sua Universidade, quando os hormônios falavam mais alto e as estórias contadas pelas suas amigas aguçavam ainda mais a sua curiosidade. Sentia-se como uma adolescente.



Voltou para a cama, mas custou a dormir novamente. A voz de Aaron Hotchner lhe fazia companhia em seus pensamentos, os olhos dele pareciam espelhos dos seus, o corpo do homem que amava lhe fazia falta ao seu lado. Como o amava! Como o desejava! E como estava sendo idiota, muito idiota, acordada naquele horário, deixando de usufruir de um descanso que no dia seguinte lhe faria falta, pensando em um homem que a tratava como sua “agente em campo” e nada mais. Brava consigo mesma e com alguma dificuldade, Emily adormeceu novamente.


Pela manhã, no caminho do escritório, pegou-se pensando em alternativas para reverter aquela situação. Não tinha porque sustentar um sentimento que não levaria a nada. Não iria viver da companhia de um fantasma ao seu lado, na esperança de que este homem lhe remetesse um sorriso, lhe dirigisse uma palavra mais afetuosa. Não, chega! Tudo na vida tem que ter limites. Ela se apaixonou, iria aprender a se desapaixonar. Iria se concentrar no seu trabalho, voltaria a sair nas suas folgas com algumas amigas e iria se apaixonar novamente por um homem que lhe merecesse. Já dentro do elevador, Emily sorriu de si mesma, como se quisesse acreditar que tudo que decidira aconteceria de fato. Sabia que com a mesma facilidade que ela discursava para si mesma querendo acreditar no que dizia, ela seria desarmada pelo primeiro olhar de Hotch. Ou quando o ouvisse dizer seu nome. Quem ela queria enganar! Enfim, ao chegar poucos minutos após o horário foi pega de surpresa por uma reunião que acontecia a portas fechadas com toda a sua equipe.


- Só estávamos aguardando você chegar. -  Hotch tinha os olhos mais escuros que o normal, se é que isso fosse possível.
- Desculpem-me, peguei um pouco de trânsito. Algum caso urgente?
- Emily, sente-se. - Morgan disse meio desajeitado. Emily reparou inclusive que Garcia estava presente à reunião, coisa que só acontecia em casos muito sérios.



-Ok! É o seguinte. – Hotch parecia não saber bem por onde começar.
- Vocês sabem que eu tenho lutado o tempo todo para manter este grupo unido e com as melhores condições de trabalho possíveis. Eu sei que trabalho com os melhores profissionais que existem na nossa área e nosso departamento só é um dos mais eficientes dentro do FBI porque existem duas coisas fundamentais que solidificam este grupo: competência e confiança. Competência eu sei que vocês tem de sobra. O que eu preciso que vocês tenham neste momento comigo é confiança. Claro que vocês sempre confiaram em mim, mas eu preciso que agora vocês confiem ainda mais. Eu tive que tomar uma decisão difícil e preciso que ela não seja questionada por nenhum de vocês. Eu fiz o que eu acho ser o mais acertado para o time, para todos nós, inclusive para mim. A partir de hoje todos nós, e isto me inclui no grupo, teremos um novo chefe. Morgan está assumindo a chefia deste departamento no meu lugar. Eu irei continuar a trabalhar aqui com vocês, mas todos passam a reportar-se diretamente ao Morgan. 


Hotch ia continuar falando, mas sentiu que seus agentes precisavam de um momento para absorver aquelas informações. Tomou dois goles de um copo de água que estava à sua frente e prosseguiu.


- Morgan vai precisar de todo apoio e tenho certeza de que isto não faltará a ele por parte de nenhum de nós. É provável que mais tarde todos vocês recebam um memorando da Diretoria efetivando a promoção e comunicando as mudanças ocorridas no departamento, mas eu quis que meus..... meus melhores amigos soubessem disto diretamente de mim. 

Emily ainda estava tentando processar a informação. Não entendia como aquilo tudo estava acontecendo. Queria explicações, queria saber porque. Nada contra Morgan, mas aquilo tudo tinha que ter um motivo para acontecer.


- Você só vai dizer isso? Quer dizer, por que você tomou essa decisão? 


Hotch suspirou. Ele sabia que se alguém o questionasse naquele grupo esse alguém seria Emily Prentiss.



- Emily, tenho certeza de que vocês vão ouvir toda a sorte de boatos nas próximas horas, mas eu não acho produtivo ficar aqui explicando minhas razões. Por isso pedi que confiassem em mim. Espero que isto seja o suficiente.


Emily se calou, embora todas as palavras quisessem escapar de sua boca. Não conseguia acreditar no que estava acontecendo. Será que ele nunca teria paz? Apostava o que tinha de mais valia que isto era obra daquela cobra da Strauss e a odiava ainda mais por isto. Olhou para Hotch por uns instantes,tentando decifrar que sentimentos seu rosto refletia, mas encontrou uma expressão impenetrável, despida de sentimentos, quase inumana. Aaron Hotchner mais Aaron Hotchner do que nunca.


- Agradeço todo apoio que tive de vocês e espero que ele nunca falte ao Morgan. O que vai acontecer amanhã, depois de amanhã, na verdade eu não sei. Apenas o tempo vai poder dizer. Temos um caso novo e precisamos nos concentrar nele agora. Morgan, acho que você deve ter alguma coisa a dizer.


- Apenas quero que vocês saibam que fui pego de surpresa da mesma que forma que vocês. Hotch me pediu que confiasse nele e assumisse a chefia do Departamento e é o que estou fazendo. Tenho certeza de que isto será uma coisa provisória, então apenas vamos tocar as coisas da melhor maneira possível.

Foi Garcia que interrompeu o silêncio constrangedor que se formara no ambiente.

- Você vai ter uma sala?
- Sim, Garcia – Hotch se antecipou à resposta – Vou deixar minha sala livre nas próximas horas e Morgan se mudará para lá.
- Nãaao! De jeito nenhum. Não quero sua sala Hotch, não quero ficar ali. Aquele espaço é seu e não vou me sentir à vontade nele.
- Mas você precisa de uma sala, de privacidade. Se vamos fazer isto, temos que fazer direito.



- Posso verificar se temos algum espaço livre, alguma forma de remanejamento, para que Morgan tenha um espaço, mas não tenha que ocupar a sua sala. - JJ, sempre de forma muito eficiente, reforçou ainda que esses remanejamentos eram muito comuns no Bureau por força das constantes alterações de cronogramas devido às prioridades que se estabeleciam no dia a dia.

- Olha cara, eu vou fazer o que você me pedir, mas não me faça ocupar aquela sala, ok?

Hotch assentiu levemente e percebeu de imediato como seria difícil fazer aquela transição. Seria difícil para aquelas pessoas passarem a vê-lo apenas como um igual, seria mais difícil para Morgan ser visto como um líder, com a presença dele ali, tão próxima.

- Ok, temos trabalho a fazer, então, que tal JJ passar o caso para nós? Morgan ainda olhou para Hotch como que esperando uma aprovação por sua atitude naquele momento, mas ela não veio.

Durante a exposição do caso, Emily perdeu-se em pensamentos. Como aquilo seria provisório? Por que ele tinha tomado aquela decisão? Como ele estaria se sentindo naquele momento? Ela sabia que ele sempre fora orgulhoso, vaidoso mesmo da posição que alcançara dentro do FBI. Como ele iria lidar com aquilo? Era como dar dois passos atrás. Precisava ter cautela pois não deveria parecer interessada demais em como ele estava se sentindo, mas também queria estar atenta aos sinais, caso ele estivesse precisando de ajuda.


- Ok! Então no avião em trinta minutos! – Morgan disse, ainda que pouco à vontade em convocar seus colegas. – Emily, tudo bem?
- Sim, claro, tudo certo. Vou juntar algumas coisas e já nos encontramos no avião.


Garcia, atenta à tudo à sua volta, fechou sua pasta, recolheu alguns outros papéis, sua caneta do Garibaldo e seu celular e, ao passar por Emily, ainda sentada em sua cadeira, cochichou em seu ouvido:
- Ele vai ficar bem! Não se preocupe! - E seguiu em frente sem olhar para trás, mas com um leve sorriso estampado no rosto. Garcia adorava quando tinha razão.



Ela sentiu um frio na espinha. De que ela estava falando? De Hotch? De Morgan? Será que ela era tão óbvia assim? Certo mesmo, é que precisava retomar o controle da situação. Levantou-se e antes de passar em sua mesa foi ao toaillete, lavou o rosto, molhou a nuca, olhou-se no espelho e respirou fundo. - Bem, vamos trabalhar.
Já em sua mesa, verificou tudo o que deveria ser levado, checou os itens em sua pasta, e certificou-se de que não havia nada faltando. Rossi passou por ela carregando sua maleta e perguntou se Reid precisava de ajuda com as muletas. Ambos seguiram para o elevador e Emily acreditou ser a última a sair do escritório. Permitiu-se então, antes de sair, parar para tomar um café rápido. Pegou a caneca, abriu o adoçante e antes que pudesse servir-se, sentiu atrás de si uma presença, depois uma mão apoiada levemente em seu ombro, e em um murmúrio em seu ouvido, por entre as mechas de seu cabelo, uma única frase:

- Vai dar tudo certo, Emily!

E antes que pudesse se virar, Hotchner já havia seguido para o elevador.
Emily não podia se mover. Não queria nem saber porque ele achara que precisava dizer isto à ela. Tinha medo da resposta, qualquer que fosse ela, não poderia ser boa. Ela pôs o café de lado, pegou suas coisas e seguiu para o avião. Durante todo o caminho procurou não pensar em absolutamente nada, apenas ouvir aquela frase como um mantra em seu pensamento, como forma de se convencer de que o homem que amava tinha razão: Vai dar tudo certo! Vai dar tudo certo!

FIC - PEDRAS NO CAMINHO - CAPÍTULO 5


“NA PROSPERIDADE NOSSOS AMIGOS NOS CONHECEM, NA ADVERSIDADE CONHECEMOS NOSSOS AMIGOS”.

 
John Churton-Collins



Haviam sido dois dias de muito trabalho, mas finalmente os papéis estavam sendo postos em dia. Já era muito tarde e Aaron Hotchner ainda revisava casos com Jeniffer Jareau em sua sala no Bureau. Havia ficado satisfeito por ouvir a opinião de JJ num caso de racismo em Baton Rouge. Ela era competente e estava no seu melhor momento no BAU. No entanto percebeu certa inquietação sua quanto ao avançado da hora, coisa que ela justificou como problemas de seu bebê com a troca de fraldas. Às vezes ele se esquecia que seus agentes tinham uma vida lá fora. De fato, aquilo não era hora de segurar uma agente como JJ e ele sentiu-se feliz por dispensá-la.


- Faltam somente cinco casos.
- Não, podemos fazer isso amanhã, vá para casa, por favor.


Ela disse algo sobre uma última distribuição e despediu-se. Ele subiu as escadas até sua sala disposto a encerrar aquele dia com um saldo positivo. Havia sido um período produtivo e todos pareciam estar prontos para uma nova investida.

Abriu a porta de seu escritório com certo regozijo, não era sempre que podia dizer que tinha tido um bom dia. Mas seu prazer durou apenas segundos após abrir sua porta. A visão de Erin Strauss o trouxe a uma realidade que ele hesitava em encarar, mas que naquele momento era impossível negar : chegara a hora. Quando ela disse as palavras : “ – Precisamos conversar. Feche a porta” sua mente começou a trabalhar rapidamente, tentando fazer um apanhado de todas as reflexões que fizera nas últimas semanas. Quais eram as possibilidades? O que ela iria exigir? O que ele teria que fazer?
 

Foi uma conversa relativamente curta. Na verdade quase um monólogo. Ela queria que ele deixasse o BAU e ponto. Ela tinha certeza de que sua capacidade de chefiar aquele departamento estava comprometida até o pescoço. E que suas decisões começariam afetar o comportamento de seus agentes em comando. Tinha que se reportar a seus superiores e queria ter uma solução definitiva para uma situação que já se arrastava por muito tempo. Ele poderia escolher um outro departamento desde que fosse aprovado por ela. E só. 
Hotchner foi incisivo. Não deixou espaço para ela pensar pois essa decisão ela não havia considerado. 

- Esta equipe é boa no que faz, você não pode dissolvê-la assim.Temos tido muito mais resultados positivos do que o contrário. Mas tenho uma proposta. Se o problema é minha capacidade de julgamento para tomar decisões, para comandar, eu abro mão disto. Estou promovendo internamente Derek Morgan para a chefia deste departamento e a ele me subordinarei sem quaisquer restrições.


Erin Strauss parecia não acreditar no que estava ouvindo. Já havia tido embates com diversos funcionários, mas nunca havia encontrado uma pessoa tão obstinada assim. Ele estava prestes a abrir mão de tudo em sua carreira, prestígio, salário, regalias, até respeito, em nome de não abrir mão de uma crença. A de que estava fazendo a coisa certa em manter a equipe unida. Já havia cruzado com chefes paternalistas que protegiam seus subordinados com toda a convicção, mas Aaron Hotchner era um exemplo de renitência. 

- Você não pode recusar. O que está sendo posto em discussão aqui é a minha capacidade de chefiar uma equipe e eu estou abrindo mão desta atribuição. Derek Morgan é meu melhor agente em campo e também um profiler exemplar. Tem espírito de liderança, é equilibrado e sempre agrega ao seu trabalho os melhores resultados. Se eu estiver prestes a errar, ele é a pessoa correta para me alertar disto. É jovem, cheio de ambições e está totalmente preparado para assumir a chefia deste departamento, sem restrições.



Strauss estava confusa o suficiente para não entrar numa discussão sobre os motivos de Hotchner para tomar esta decisão. Ela realmente não esperava por isto. Mas, também não tinha como refutar tal pedido. Se estava bom para ele, para ela também estaria. Ela tinha a impressão de que ele se enforcaria com a própria corda e isto para ela era o suficiente.
 
- Preciso revisar isto com o diretor.

Quando ela saiu, Hotchner respirou fundo e passou a revisar suas palavras. Tinha certeza de que tinha tomado a decisão certa. Já havia lhe passado pela cabeça tal idéia, a de deixar a chefia do departamento em detrimento de poder acompanhar de perto a captura de Foyet. Não podia afastar-se naquele momento. Não queria. Qualquer coisa seria melhor do que deixar o BAU naquele momento. Já havia perdido muitas coisas por aquele trabalho. Havia perdido seu casamento, seu filho, sua crença em dias melhores, não iria perder a oportunidade de capturar o homem que havia tornado sua vida um inferno. Além do que, sabia que eram mínimas as chances de manter a equipe unida com a sua saída.

Morgan estava longe de estar preparado para assumir seu cargo. Culpa sua. Poupava seus meninos de maiores responsabilidades, dos trabalhos chatos, da burocracia e da política. Pedia a eles que fizessem aquilo que sabiam fazer de melhor . O resto ele resolvia. E sempre podia contar com Rossi ao seu lado, o que era de grande valia. 

Morgan também deveria disciplinar seu temperamento. Graças á Deus Erin Strauss não conhecia tão bem assim os membros de sua equipe para questionar o nome de Morgan. Mas ele era sua melhor opção. Morgan tinha um gênio difícil, mas o respeitava profundamente. Sabia que ele entenderia seus motivos e quem sabe, com sorte, poderia um dia no futuro, ter seu cargo de volta. O importante agora é que deveria fazer o que tinha que ser feito. Preparar Morgan para o que estava por vir.



Quando JJ entrou em sua sala ,antes de ir embora, para ver se estava tudo bem com ele, teve que se conter para não deixar suas emoções transparecerem. Não que isso fosse incomum, mas naquele momento, Hotch estava sentindo todas as emoções do mundo perpassando por seu coração e ninguém da equipe deveria perceber nada até que ele estivesse pronto para comunicar sua decisão.

Quando pela manhã chegou o novo caso, a de mulheres desaparecidas em Albuquerque, Novo México, sabia que teria uma oportunidade única de por à prova a eficiência e a resistência de Derek Morgan. Tinha tudo para ser um daqueles casos terríveis e não haveria melhor momento para pressioná-lo. E foi o que fez. Foi difícil manter o foco no caso e ao mesmo tempo apertar Morgan de forma adequada. Naturalmente, sem precedentes, ele estrilou. Reclamou de preencher papéis que antes nunca havia preenchido, reclamou pela falta de confiança de seu chefe em seu pré julgamento, estranhou estar sendo questionado. Hotch nem se quer se surpreendeu quando Morgan invadiu a sala da delegacia como uma bala reclamando sob a pressão de escrever um plano para justificar a detenção dos unsubs sem ferir prováveis crianças feitas reféns. Afinal, ele desconhecia aquele trabalho, culpa sua, de novo, pois era sempre ele quem fazia estas coisas. O que Hotch de fato lamentou foi pegar pesado com Morgan sem poder antecipar o que iria acontecer. Mas testar sua capacidade e principalmente sua confiança era fundamental. O que o preocupava mesmo era seu temperamento, mas vendo-o naquele quarto negociando com a mãe a criança que ela detinha em seus braços, Hotch teve certeza de que estava agindo corretamente.
Sentiu de fato grande alívio quando o caso foi encerrado e ao voltar, pôde finalmente ter uma conversa franca com Morgan. Achou a princípio que seria uma conversa difícil e muito constrangedora, mas foi mais fácil do que imaginara. Na verdade sentia-se aliviado naquele momento em poder dividir seus sentimentos com alguém como Morgan.



Claro que pegou o rapaz totalmente de surpresa e ficou lisonjeado com o fato de saber que tinha seu total apoio para enfrentar Erin Strauss se assim quisesse. Mas haviam batalhas que não deviam ser disputadas. A despeito de todo o apoio de Morgan, sabia que era o momento de ceder. Dividir para conquistar. Sabia que estava tomando a decisão correta. Achou graça de Morgan quando ele reclamou por ter sido pressionado, pobre rapaz, ele nem imaginava o que o esperava. 

Foi uma longa noite. Horas de explicações, antecipação de fatos dos quais Morgan deveria estar ao par, foi de fato, cansativo. Quando a exaustão se abateu sobre os dois, Hotch o mandou para casa descansar pois seria um dia muito longo e cheio de novidades o que viria a seguir.

Despediram-se nas escadas e Morgan antecipou-se a ele com duas caixas de papéis em suas mãos. Hotch, no entanto, ficou mais uns minutos em seu escritório. Olhou para as paredes à sua volta, como a estudar o que viria pela frente. Fechou a porta atrás de si e desceu as escadas distraidamente. Caminhando por entre as mesas teve por um momento uma lembrança, de um dia não muito distante, de estar seguindo Emily por entre os corredores do Bureau, quando ele já permitia que o cansaço e a bebida daquele noite guiassem os seus pés. Confuso, não sabia o que mais o surpreendia, afinal, estava com tantas preocupações no momento em sua cabeça que não imaginava porque havia se lembrado daquilo. Aliás, nem lembrava-se de quando passara a pensar na agente Prentiss como Emily. Não tinha idéia de porque naquele momento a visão do corpo de Emily guiando-o à sua frente lhe parecia tão confortável, mas havia sido um dia exaustivo e a presença desta imagem em sua mente lhe fazia bem. Seguiu até seu carro como se a seguisse também e era com este imagem agradável, mesmo que não soubesse bem do porquê, que ele desejaria terminar sua noite. Com a imagem do corpo de Emily em sua mente. O corpo de Emily.

FIC - PEDRAS NO CAMINHO - CAPÍTULO 4





O VALOR DAS COISAS NÃO ESTÁ NO TEMPO QUE ELAS DURAM, MAS NA INTENSIDADE COM QUE ACONTECEM. POR ISSO, EXISTEM MOMENTOS INESQUECÍVEIS, COISAS INEXPLICÁVEIS E PESSOAS INCOMPARÁVEIS...


Fernando Pessoa



Emily Prentiss virou-se em direção à porta do café e caminhou até a rua. Resistiu à tentação de virar-se para trás para vê-lo novamente. Emily tinha certeza de que tinha deixado seu chefe totalmente embaraçado com o encontro na cafeteria e ela não sabia bem porque. Seu péssimo hábito de falar sem pensar, às vezes a levava à situações assim. Porque ela deveria achar que ele estava à sua procura? E se estivesse, não teria ligado antes? Fez papel de tola. Claro que havia sido coincidência e sua presunção em acreditar que ele poderia estar à procura dela deixou-o desconcertado. Deveria ter agido naturalmente. Não deveria ter se exposto desta forma. E perguntar se ele precisava de companhia? Em horário de trabalho? Meu Deus, em que ela estava pensando? 

Emily sabia o que estava pensando. Pensava em Aaron Hotchner, aquele homem lindo e apaixonante que não saia de sua cabeça nos últimos meses. Isso ainda lhe causaria problemas.
Atravessou a rua e caminhando pela calçada até atingir o prédio onde trabalhava, Emily recordou-se dos minutos que haviam passado juntos no seu carro, no dia anterior, quando o havia deixado em seu apartamento. Ela continuava preocupada. Ele parecia estar em outro mundo enquanto ela falava com ele. Procurou puxar assunto até que se calou porque percebeu que falava sozinha e devia estar incomodando-o.
 

Ela tinha que se conformar com o fato de que o homem que amava estava sofrendo tremendamente e que ela pouco poderia fazer para mudar isto. O olhar de Hotch no café ao encontrar com ela era um olhar meio surpreso, um olhar de quem luta para entender o que está acontecendo à sua volta. Um olhar perdido, mas, por um momento, enquanto perguntava se precisava de companhia , olhou fixamente para aqueles olhos e notou um brilho intenso, nos milésimos de segundos que se seguiram. Foi muito rápido, mas ela tem certeza de que no meio de muita confusão e ressentimento ela pode notar uma centelha, instantânea, mas muito intensa, invadindo a escuridão daqueles olhos. Ou sua percepção estaria alterada por causa de seus sentimentos? Não, ela estava apaixonada sim, mas sabia reconhecer um brilho diferente nos olhos do homem que observava tão de perto. Não sabia bem o que significava, mas estava lá, ela tinha certeza.
Emily tomou o elevador e respirou fundo. Precisava se concentrar. Precisava manter longe seus pensamentos pouco respeitosos enquanto estivesse trabalhando. E assim, dirigiu-se até sua mesa, cumprimentando a quem encontrasse em seu caminho.


- Conseguiu descansar? Reid perguntou enquanto mexia com alguns papéis à sua frente.
- Sim, foi desgastante o dia de ontem, mas nada que um bom banho e uma ótima noite de sono não tenha resolvido. E você?
- Tudo bem. A perna incomoda um pouco, mas vai ser bom trabalhar sentado por algum tempo.

A perspectiva de trabalho interno parecia agradar a todos. JJ passou por eles e os cumprimentou.

- Hey, Emily, será que foram mesmo apenas banho quente e boas horas de sono? Você está com aquele brilho no olhar.......
- Claro, ontem, depois de tudo o que vivemos com aqueles malucos teria sido a noite perfeita para um encontro romântico. Ora Derek, nem você, atleta de alcova, teria tido um encontro romântico ontem à noite. Me deixe em paz!
- Não sei não, você está com “aquele” brilho no olhar. Vamos me conte, quem é o cara?
- Hey Rossi, Emily não está com aquele olhar? 



Rossi vinha descendo as escadas e parou perto de Morgan.

-Técnicamente não existe um olhar diferente, existem percepções diferentes de um mesmo olhar, os estudos provam que as pupilas se dilatam quando você se apaixona, mas o olhar em si continua o mesmo porque.....
- Está! - Rossi interrompeu Reid sem nenhuma consideração. - Emily está apaixonada.
- Vocês todos estão precisando arranjar algo com que se preocupar!
- Já arranjamos – Morgan riu – Você! Há algo de perverso em se preocupar com a vida sentimental e sexual de Emily Prentiss e isso é um ótimo entretenimento.
-Que tal dúzias de relatórios para preparar?
- Vamos menina, nos dê algo, só uma dica, quem é o cara de sorte?
- Não há cara de sorte, apenas estou me sentindo bem hoje, nada além disto. Aliás, o cara de sorte será você em terminar todo o seu serviço sem precisar de ninguém pegando no seu pé. - Emily sabia o quanto Morgan odiava trabalho interno. Seu negócio era ação, dirigir em velocidade, chutar as portas, pegar os caras maus, relatórios deveriam ser para burocratas engravatados.
- Na verdade eu estava pensando em passar alguns destes para o nosso amigo Reid aqui.
- Hey, nem pense. Já tenho umas 7 pastas aqui na minha mesa -  Reid resmungou.
- Prentiss está apaixonada, mas está certa. – Rossi abaixou o tom de voz dirigindo-se especificamente à Morgan. Há muito serviço a fazer e você tem que colocá-lo em dia. Se quiser crescer profissionalmente um dia você tem que saber que há muito mais do que derrubar portas para estar nesta posição.
- Rossi, você sabe que não vou ser chefe nunca. Já tive um convite e recusei porque não nasci com temperamento para política e burocracia. Sei que os papéis precisam ser preenchidos, mas deveria haver alguém que fizesse isso para os agentes de campo. Isso tudo é muito chato!
- Morgan você não preenche 5% dos papéis que deveria preencher. Espero que saiba disto!
- Como, Rossi? E quem faz este trabalho para mim, pra nós?
- Alguém que gosta muito de vocês....... 

Rossi riu e saiu sem dar maiores explicações. Morgan, assim como Reid, ficou com cara de “ você está me gozando?” e só pode acreditar que Rossi estava pegando no seu pé.
Emily pensou no que Rossi havia dito. Ela sabia que as horas noite adentro de Hotchner naquele escritório eram para agilizar e facilitar o trabalho de seus agentes. Havia sempre muita papelada, mas ele não tinha muito porque correr há muitos meses a não ser para o vazio de seu apartamento, então, ele não se importava de fazer aquele trabalho. Além disto ela sabia que ele gostava do que fazia. Ela sabia e não podia fazer nada. Era um pena.

O agentes voltaram-se para seu trabalho, mas Emily, durante diversas vezes naquele dia se pegou olhando discretamente para a janela da sala de seu chefe. Algo a desconcentrava, por mais profissional que tentasse ser. E ela desconfiava saber o que era. Muito provavelmente aquela centelha no olhar escuro de Aaron Hotchner.