sábado, 1 de setembro de 2012

O QUARTO PODER, VIDA INTELIGENTE E A ROSA PÚRPURA DO CAIRO - NEWSROOM





Quando nos promórdios da ousadia televisiva Aaron Sorkin lançou Sports Night, depois de algumas tentativas  bem sucedidas em teatro e cinema ( Malícia, com Nicole Kidman, Meu Querido Presidente, com Michael Douglas, Questão de Honra, com Jack Nicholson, entre outros), descobriu-se que ele tinha um dom: o de falar sobre aquilo que seria seu ganha pão, de uma forma ou de outra, não importando a quem fosse doer. A série tratava dos bastidores de um programa sobre esportes e sobreviveu 2 temporadas. Quando a série foi cancelada por baixa audiência ele não deu-se ao trabalho de aceitar em continuar a série em outra emissora, então interessada, pois já vinha desenhando e redesenhando sua pequena obra prima: The West Wing. Juntavam-se duas paixões - os bastidores do poder e os bastidores da imprensa, tanto na forma da assessoria propriamente dita vinda sob as ordens do primeiro escalão, como em sua repercursão no Quarto Poder, sua relação e seus conchavos com aqueles que decidem aquilo que você, espectador passivo do dia a dia pode ou não pode saber - pelo menos não de imediato. 

A série foi um sucesso brutal e nos seus quase 7 anos anos de exibição arrebatou uma quantidade sem fim de prêmios Emmy, em sua maioria como melhor série dramática. Infelizmente as recaídas de Aaron  no vício com as drogas o levaram a se afastar em alguns momentos cruciais de série, mas uma equipe competente de roteiristas não deixou a peteca cair. Mesmo com a morte de um ator, cujo papel era de suma importância ( John Spencer - como Leo McGarry) manteve-se ainda a série no ar por mais um ano, ainda que já que não com a mesma integridade. Tendo se afastado por algum tempo, Aaron ainda voltou para dar um final com sua cara no término daquela que foi a série que marcou o coração do serimaníaco apaixonado por temas ligados à política e à imprensa.

Em 2006, mantendo suas principais características de textos rápidos e cheios de duplo sentido, que o consagraram em The West Wing e ainda na mesma vertente, lançou Studio 60 On The Sunset Strip, desta vez falando sobre os bastidores televisivos de programas de humor no estilo Saturday Night Live. O programa teve apenas uma temporada já que, atingia na veia a imprensa, os críticos e os egos desestabilizados de Hollywood ( a série, no meu ver, é uma pérola, mas está longe, muito longe de ser um programa que dê audiência. Eu lamentei profundamente seu cancelamento). Inteligência e audiência nem sempre andam de mãos dadas no showbizz.

Para meu deleite, resignada à meia dúzia de séries que resistem com criatividade e bons roteiros ao péssimo gosto da audiência americana, eis que Aaron ressurge com uma lufada de inteligência e ousadia com a estréia de Newsroom, outra série sobre aquilo que ele melhor sabe falar: Imprensa e o Quarto Poder. Desta vez vista sob o prisma da atualidade, utilizando-se de um recurso interessante, que foi o de retardar os episódios no tempo, de forma a poder explorá-los quase imediatamente após terem acontecido, sem a necessidade de criar estórias paralelas e trabalhando com a realidade, diferente de West Wing onde ele tinha liberdade para criar estórias a seu bel grado, mas onde nem sempre acertava seus palpites com o acontecido.

Newsroom - Está tudo lá: o âncora letárgico preso às amarras da audiência, o frescor da juventude recém formada, ávida por acertar e fazer carreira, as elocubrações e malabarismos entre o que é certo e o que o correto - havia, não sei se ainda há, uma cadeira em Psicologia Desenvolvimentista onde se discutia as diferenças entre o certo e o correto - fascinante, por sinal -  ( as diferenças são tão sutis no meio que confundem até quem assiste mais de uma vez os primeiros episódios), as relações interpessoais que surgem entre quem passa vinte horas por dia juntas e acabam misturando convivência e conveniência. 

Como todo bom roteiro de Sorkin, ele costuma ter um texto ágil, atrevido e em geral, dizer muito mais nas entrelinhas do que no texto propriamente dito. Sem querer deixar claro spoillers, o quarto episódio, assim como me disse uma amiga, me trouxe às lágrimas. Talvez porque eu ainda queira acreditar. Talvez porque eu seja muito mais Will McAvoy do que eu gostaria de ser. Talvez porque minha Mackenzie McHale tenha vontade de sair aos brados por aí. Ou, provavelmente, porque eu tenha em mim, de todos, um pouco deles compondo todo meu ser.

Se ainda assim, por Sorkin, eu ainda tivesse um fio de dúvida, haveria Jeff Daniels. Eu me apaixonei por ele em 1985 ou 6, em A Rosa Púrpura do Cairo de Woody Allen ( talvez seu filme mais cruelmente romântico). Se você não sabe a que filme eu me refiro, esqueça: você nunca irá me entender. Pare tudo, encontre ele na locadora, no Netflix, nos downloads da vida, assista e depois volte a ler o meu texto. Ele é um daqueles atores que você sempre vê naqueles filmes inesquecíveis, mas nunca sabe direito o nome ( não é, obviamente meu caso). Devo ter visto A Rosa Púrpura do Cairo umas cem vezes. A Era do Rádio, outras não sei quantas. Mas meu preferido passou a ser então Pesadelo na Rua Carroll. Depois, fuçando, descobri Na Época do Ragtime, A Difícil Arte de Amar. Me emocionei quando ele morreu em Velocidade Máxima - dá para acreditar? - ( depois de 25 anos já não é spoiller, é?), mas foi em a Vida em Preto e Branco que me apaixonei de vez pela interpretação franca e honesta de um ator sem grandes apelos físicos, de voz contida e emoção à flor da pele, ou seja, um ATOR, destes que Hollywood já não fabrica mais. Se você quiser saber o que é uma boa atuação, sem o estardalhaço de Leonardo de Caprio ou Brad Pitt, assista A Lula e a Baleia e, se já está no embalo de Newsroom, acrescente no pacote o imperdível Boa Noite e Boa Sorte ( em branco e preto, só para quem é apaixonado pelo tema e por atuações vicerais).

Voltando à série, sua atuação como Will em Newsroom até agora só tem engrandecido um papel escrito sob medida para ele. Quanto aos outros atores, passei, por exemplo, doze anos apaixonada pelo promotor implacável Jack Mcoy de Sam Waterston de Lei e Ordem, então, está divertido vê-lo fazendo algo tão diferente e sem qualquer gel para domar os rebeldes cabelos, agora mais embranquecidos e mais longos. Ele está com setenta e dois anos e ainda me emociona.

Sobre os outros atores, não os conheço bem, mas acho que foram até aqui, competentes para transmitir a emoção necessária para que a estória tivesse relevância. 

Só o tempo dirá se Newsroom será uma nova The West Wing. Temas e fôlego tem, mas eu ouso dizer que as pessoas hoje em dia não querem pensar. Parece que pensar dói. Lá fora, em seu país de origem e aqui. Em plena época de eleições no nosso Brasil, cheio de Tiriricas, Russomanos, Mulher Pera e Cumpadre Washington, não basta assistir ao rídiculo, obsoleto e desnecessário programa obrigatório. Nos cumpre ler mais a respeito, nos cumpre assistir séries como Newsroom e refletir, filmes como Tudo Pelo Poder ( com o substimado e sempre apenas lembrado injustamente como o galã de Hollywood George Clooney), ler muito além dos jornais e revistas que só escrevem aquilo que o quarto poder quer que saibamos. A internet se faz presente e Newsroom nos lembra disto, nos ajuda a entender um pouco melhor a dinâmica da coisa.

É emblemático quando Will descobre que tem um blog. Quanto tempo mais será necessário para que as pessoas saibam que já não podem manipular ninguém apenas pela palavra? Hoje todos tem um celular. Todo celular tem uma câmera. Um gravador. Pode levar mais algum tempo ( espantoso como demorou para cair a ficha para a equipe de segurança do príncipe Harry tal informação), mas não muito. Talvez, espero, que menos do que possa durar uma série como Newsroom. Falo com pesar porque não tenho ilusões. Na época de West Wing as pessoas pensavam um pouco. Hoje me parecem pensar um pouco menos. Converso com gente que diz que assiste ao Jornal Nacional porque o Bonner é um gato e que torce para a Fátima Bernardes voltar porque eles formam um casal lindo!!!!! Deprimente!

Perco as palavras quando ouço algo assim. Me sinto meio Mackenzie, meio  Will e tento esquecer que o poder de voto desta criatura é o mesmo que o meu, já que serão necessárias algumas gerações e muita boa vontade em se aprender para mudar tal raciocínio.

Aaron Sorkin e suas recaídas no vício das drogas não vão resolver meus problemas. Nem os do meu país, tão pouco os dos Estados Unidos da América. Mas se algumas pessoas puderem avaliar com critério suas idéias na forma da interpretação magnífica de Daniels, Waterston e cia, talvez, um dia, eu ainda possa acreditar na liberdade de expressão verdadeira, aquela que meu filho de vinte e tres anos ainda não conheceu. Aquela em que nos faça crer que o jornalismo é muito mais que uma profissão, é uma dádiva, um dom oferecido aos poucos dispostos a sacrificar  toda uma vida em nome da verdade. 

Para estes POUCOS jornalistas, eu tiro meu chapéu!!!!! 

Se você gosta de uma discussão inteligente, não perca Newsroom!!!! 

E, parafraseando a série: NÓS NÃO SOMOS UM GRANDE PAÍS, MAS PODEMOS SER ( a adaptação na tradução foi por minha conta)!

( Somente a título de curiosidade, quando prestei vestibular, no último ano do finado terceiro colegial - agora chama-se ensino médio - prestei Psicologia na Metodista, Jornalismo na FMU e Direito na Mackenzie. Entrei nas 3. Embora não atue na área já há algum tempo, agradeço por ter escolhido a Psicologia. Teria sido uma péssima jornalista - provalmente dispensada semanalmente por não concordar em me submeter ao que se chama hoje de jornalismo. Quanto a ser advogada, bem.... dispenso comentários. Embora existam profissionais honestos e desonestos em todas as áreas, eu creio que eu e a advocacia não fomos  feitos um para o outro. Não me levem a mal os jornalistas e advogados honestos , ilibados e resistentes aos conchavos nesta terra chamada Brasil, mas a vocês eu reitero meu maior respeito!)

Se quiserem comentar a série, fiquem à vontade, adoraria saber sua opinião!

Abraços!

Débora 




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