sexta-feira, 3 de julho de 2015

Aquarius 1×01: Everybody’s Been Burned


Não se deveria assistir ao piloto de Aquarius sem se ter uma boa noção dos acontecimentos mais importantes dos anos 60, principalmente nos Estados Unidos. Em 1967 Lyndon B. Johnson, que como vice assumira logo após a morte de Kennedy em 1963, estava em seu sexto ano de mandato. A década de 60 de forma geral foi rica em movimentos, advindos daquilo que a mídia americana e, posteriormente a europeia passou a chamar de contracultura. Com o final da segunda guerra mundial, jovens descontentes, com ideias libertárias, oposicionistas da guerra fria ( e, posteriormente, à Guerra do Vietnã), do militarismo, do autoritarismo e do consumismo em excesso, pela primeira vez pregavam a não violência, e mesmo que houvesse a fome e a miséria, seu lema era o da Paz e do Amor. Surgiam as primeiras comunidades hippies, o desejo de se amar ao próximo e de lutar incondicionalmente pelos direitos das minorias, em geral, mulheres, negros e homossexuais.

Estes movimentos tiveram início em várias cidades dos EUA como San Francisco, Chicago, Nova York e em Los Angeles, especificamente na Sunset Boulevard, onde a estória de Aquarius tem seu início. E se você não conhece nada disto não tem importância, a direção de arte de Adam Davis, a direção de fotografia de Lukas Etllin e o próprio criador e produtor John Mc Namara (In Plain Sight e Fastlane entre outros) não vão deixar você na mão.

aquarius 1

Sam Hodiak (David DuchovnyThe X Files, Californication) é um veterano da segunda guerra que hoje é detetive de polícia em Los Angeles, especificamente na área da Sunset Boulevard, local onde florescem os movimentos libertários, onde cabeludos e desocupados pedem por paz e amor. Em resumo, um grande mundo de moças avançadas  e músicos cabeludos e sem asseio que ele não consegue entender. Isto faz dele um homem um tanto entediado e sem muita paciência.

Ele atende ao chamado de uma mulher do seu passado, Grace Karn (Michaela Mc Manus - One Tree Hill, Law & Order: SVU), que claramente representa o “melhor” da sociedade, com status, dinheiro e relações de uma família tradicional e influente. Sua filha Emma (Emma Dumond ) está desaparecida há quatro dias, no entanto ela deixa que existe a necessidade de discrição na investigação, pois rumores poderiam atrapalhar os planos políticos do chefe de família, Ken Karn, interpretado por Brian F. O’Byrne.
Sam sabe que é para ele impossível perpetrar um universo tão diferente dele quanto possível e para isso escolhe como parceiro o jovem e um tanto rebelde Brian Shafe (Grey Damon de Friday Night Lights).
É quando eles saem atrás de uma possível pista que começamos a entender o mundo em que Sam, Brian e Emma vivem. O filtro amarelado, por vezes quase sépia usado nas câmeras retrata uma Los Angeles bucólica, um tanto entregue à sorte, quase tanto quanto os jovens que buscam através de seus movimentos uma mudança difícil de acontecer.

Sam e seu parceiro caminham por entre toda a sorte de transgressões, do consumo excessivo de drogas pesadas ao sexo livre, entre jovens cuja a idade é muito difícil prever. Nesta caminhada não demora muito para  conhecermos Charles Manson (Gethin Antony, de Game of Thrones), jovem que já havia cumprido pena, entre períodos de internação juvenil e mais nove anos de prisão.

Manson deve ter aqui por volta de trinta anos e já inicia seu aliciamento de jovens de classe abastada, cujo relacionamento familiar fosse problemático (caso de Emma), com o absurdo delírio de tornar-se um ídolo musical, uma espécie de rei do rock, compondo e interpretando suas próprias músicas. Em suas poucas cenas já se consegue ter uma noção da sandice do rapaz: usando seu carisma intrínseco enamora as jovens que o seguem (com uma lábia impressionante) com a mesma veemência que torna-se frio e cruel (como na cena do quase estupro do pai de Emma).

aquarius 2

Em uma tentativa de acesso ao grupo formado por Manson, Sam e Brian recrutam Charmain Tully (Claire Holt) para se passar por uma das seguidoras, mas ela esbarra no fiel segurança de Manson, que precisa “testar” cada moça que queira conhecê-lo. Apavorada com a possibilidade de ter que transar com o cara, ela e Brian conseguem escapar da situação de um jeito bastante improvisado.
Ao contrário de muitos eu não pretendo assistir à série em uma tacada só, uma vez que a NBC liberou os treze primeiros episódios on-line para quem quiser maratonar a série. De minha parte pretendo absorver e apreciar calmamente este espectro de referências e sensações que Aquarius desperta. Portanto, se alguém for assistir tudo de uma única vez não poderá contar com minhas reviews na mesma proporção.

Assistir aos primeiros quarenta e três minutos de Aquarius trouxe-me mais do que a curiosidade de ver retratada a história de Charles Manson, ainda que em um crime meramente ficcional. Trouxe-me a vontade de revisitar os anos 60 sob a ótica de um detetive que tem aproximadamente a minha idade, e ainda que em épocas diferentes, o mundo mudou tanto quanto surpreendente possa ter sido este período.
Recomendo que a série seja apreciada como um todo e que a expectativa não gire apenas em torno da mente doentia de Charles Manson. Se mantiver o padrão, cada episódio poderá nos brindar com uma aula de história, com referências que pautam hoje nosso mundo e são o motivo de vivermos como vivemos hoje em dia.

Nota:
  • Embora para os brasileiros não tenha o mesmo peso, creio que a trilha sonora do episódio tenha uma importância fundamental para americanos e não americanos que curtem e acompanham a história musical. São composições que carregam o momento vivido, com letras que retratam toda a carga dramática daqueles anos. Não sou grande conhecedora do tipo de música desta época, mas ela faz, sem dúvida, parte da história dos movimentos da contracultura, tanto quanto significou o movimento Tropicalista no .
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  • David Duchovny consegue ir além de Mulder com seu terno e gravata retratando Sam Hodiak. Claro que em um primeiro momento a associação é inevitável, mas bastam alguns poucos minutos para sabermos que David não é Mulder ali, é Sam, Para quem como eu acompanhou Californication então,  mudança é radical.
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  • Para quem gosta de analisar uma série sob outros aspectos, fica a dica: a fotografia é sensacional. Através dela podemos desconstruir o sentimento da cena e toda a carga emocional que ela retrata. Além do que, diversas tomadas fazem uso do steadicam, tornando as cenas altamente pessoais e trazendo uma agilidade que contrasta com a preguiçosa melancolia da fotografia. Simplesmente primoroso.
Até a próxima semana!!

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